Resenha: É Sobre Amor – Jenna Ortega

Oi pessoal, como estão?

Hoje vim compartilhar com vocês minhas impressões sobre um livro esperado por muitos: É Sobre Amor, da Jenna Ortega, que ganhou ainda mais notoriedade após seu papel como Wandinha.

Garanta o seu!

Sinopse: Eu quero que você saiba que não está sozinho. Estamos juntos. Jenna Ortega, estrela da série Wandinha, teve que equilibrar sua carreira como atriz, sua vida particular e muitas expectativas públicas desde bem jovem. Com isso, aprendeu que a única forma de superar esses desafios é por meio do amor: por seus amigos, sua família, sua fé e, acima de tudo, por si mesma. Ela usou a sabedoria que desenvolveu com seus fracassos e triunfos e colocou tudo neste livro de estreia, uma coleção de pensamentos e reflexões honestas e emocionantes. Dividindo histórias sobre o universo artístico, namoros, família, amizades e saúde mental, entremeadas por afirmações tocantes, Jenna mostra aos leitores que, enquanto houver amor, tudo é possível.

O livro foi escrito quando Jenna tinha 17 anos, e reúne anotações de seu diário, relatos de quando ela fez parte da série A Irmã do Meio, sua chegada em You e, principalmente, sua relação com a família e com a fé (porque a religião é uma parte bem importante da sua criação). Além disso, ela discorre sobre relacionamentos amorosos, aconselha os leitores sobre amizades e também fala sobre sua persistência no que diz respeito à carreira de atriz. Os assuntos prometem ser bem interessantes, mas a verdade é que eu fiquei me perguntando o que uma garota tão jovem teria de tão relevante pra dizer em termos de grandes experiências de vida. Decidi deixar meu preconceito de lado, afinal, cada processo e cada vida são únicos, e dar uma chance a essa leitura, torcendo para ser surpreendida por lições valiosas. Para a minha infelicidade, tais lições não vieram e minha percepção inicial se manteve: os conselhos de Jenna são dignos de um diário mesmo, e mais parecem frases prontas que eu encontraria no Tumblr.

Não me entendam mal, eu gosto muito dela e acredito que Jenna é uma atriz madura e sensível, com uma base forte para enfrentar as dificuldades que Hollywood impõe. Percebe-se, ao longo da leitura, que sua estrutura familiar sólida e suas crenças bem estabelecidas foram fundamentais pra construir essa jovem tão centrada que ela parece ser. Minha admiração (ainda que superficial, pois não a acompanho muito, apesar de gostar dos seus trabalhos) não mudou, e eu torço pra que ela continue com essa mesma postura para continuar crescendo nesse mercado tão competitivo e tóxico. Minha crítica diz respeito somente à forma como ela escreve mesmo, o que é esperado de uma adolescente de 17 anos que está compartilhando os pensamentos de um diário. E eu me sinto na obrigação de ser honesta sobre o teor das reflexões pra que vocês não comprem o livro pensando que vão encontrar conselhos profundos, porque não vão. São capítulos rápidos, curtos e superficiais, e você tem que ler nas entrelinhas e tirar leite de pedra pra encontrar lições que sejam valiosas pra você. Eu encontrei algumas, não nego, mas de forma geral não foi uma experiência marcante.

Eu gostaria de ter lido menos frases prontas e genéricas e mais relatos pessoais sobre as experiências de Jenna como pessoa e como atriz. O livro, apesar de ter sido baseado no diário dela, é surpreendentemente impessoal. Existem poucas passagens que mostrem realmente o quanto ela deu duro pra chegar onde chegou, como ela fez pra abrir tais caminhos ou quais foram as maiores dificuldades no set ou fora dele. No lugar desse tipo de abordagem, o livro é mais focado em conselhos sobre ser você mesma, não perder a fé, manter a gratidão e a positividade, coisas nesse sentido. Pra mim, foi complicado me manter conectada à Jenna, porque parecia que eu estava lendo algo muito plástico e cuidadosamente recortado, em vez de uma experiência real.

É Sobre Amor pode ser uma leitura bacana para jovens que estejam entrando na adolescência e busquem inspiração para começar essa faixa etária com uma referência positiva na vida e que possam ser mais facilmente impactados por “frases de Instagram”. Comigo não deu muito certo, mas como cada leitor tem uma experiência, fica a resenha sincera pra quem se sentir com vontade de ponderar a respeito e dar uma chance. 😉

Título original: It’s All Love: Reflections for Your Heart & Soul
Autora:
Jenna Ortega
Editora: Rocco
Número de páginas: 232
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Livro cedido em parceria com a editora.
Esse não é um publipost, e a resenha reflete minha opinião sincera sobre a obra.

Resenha: Amêndoas – Won-pyung Sohn

Oi pessoal, tudo bem?

É sempre difícil pra mim escrever sobre livros hypados, especialmente quando eles não causam em mim a mesma comoção que nos outros leitores. Por isso, demorei meses pra vir falar sobre Amêndoas com vocês.

Garanta o seu!

Sinopse: Yunjae nasceu com uma condição neurológica chamada alexitimia, ou a incapacidade de identificar e expressar sentimentos, como medo, tristeza, desejo ou raiva. Ele não tem amigos ― as duas estruturas em forma de amêndoas localizadas no fundo de seu cérebro causaram isso ―, mas a mãe e a avó lhe proporcionam uma vida segura e tranquila. O pequeno apartamento em que moram, acima do sebo da mãe, é decorado com cartazes coloridos com lembretes de quando sorrir, quando agradecer e quando demonstrar preocupação. Então, no seu décimo sexto aniversário, véspera de Natal, tudo muda. Um ato chocante de violência destrói tudo que Yunjae conhece, deixando-o sozinho. Lutando para lidar com a perda, o garoto se isola no silêncio, até a chegada do problemático colega de escola Gon. Conforme começa a se abrir para novas pessoas, algo se modifica lentamente dentro dele. Quando suas novas amizades passam a apresentar níveis de complexidade, Yunjae precisará aprender a lidar com um mundo que não compreende e até se colocar em risco para sair de sua zona de conforto.

Somos apresentados a Yunjae, um jovem que foi diagnosticado com uma condição rara: suas amígdalas – partes do cérebro parecidas com pequenas amêndoas, responsáveis por processar e regular as nossas emoções – são subdesenvolvidas desde seu nascimento, por isso ele foi diagnosticado com alexitimia, ou a incapacidade de indentificar e expressar sentimentos como medo, tristeza, desejo ou raiva. Para lidar com essa situação incomum, a mãe e a avó de Yunjae criaram um ecossistema pensado para protegê-lo: elas lhe ensinaram tudo que podiam sobre expressões faciais, respostas e reações ideais a diversas situações, treinaram com ele diálogos hipotéticos e imprimiram cartazes pela casa com palavras importantes que ele precisaria aprender. Em seu pequeno mundo controlado, Yunjae estava em paz. Os três viviam juntos e felizes em cima do sebo da mãe de Yunjae, ele frequentava a escola e existia harmonia na rotina da família. Porém, uma tragédia acontece em seu aniversário de 16 anos, levando à morte de sua avó e ao coma de sua mãe. Yunjae se vê sozinho pela primeira vez, tendo que enfrentar o desconhecido em um mundo que não está preparado para lidar com suas peculiaridades. A partir daí, o jovem é exposto a novos personagens, com destaque para dois: o Dr. Shin, amigo de sua mãe e dono do prédio em que eles moram, que se torna uma espécie de amigo e mentor do rapaz; e Gon, seu novo colega de escola, um rapaz briguento e problemático que cruza o caminho de Yunjae de um modo bastante marcante.

O livro é narrado pela ótica de Yunjae, acompanhando sua vida e sua perspectiva. Os capítulos são curtos e fáceis de ler, com uma narrativa leve e fluida que fazem o virar das páginas ser bastante ágil. Porém, apesar dessas características, demorei mais do que gostaria pra concluir essa leitura. E o motivo é fácil de resumir: desconexão com o protagonista, pois Yunjae não é um personagem ao qual me afeiçoei. A forma como ele narra é, obviamente, sem sentimentos, mas nem foi (só) por isso que o livro não me cativou. Acredito que eu esperava uma narrativa mais reflexiva, mas ela é muito mais factual: ele apenas vai contando o dia a dia dele, e as reflexões sobre o que ocorre não são poéticas ou profundas. Isso torna o livro ágil e fácil de ler, porém, superficial. Talvez o público-alvo dele seja muito jovem, ou talvez seja uma escolha estilística intencional pra refletir a sensação da alexitimia do personagem, mas acabou me afastando emocionalmente da obra. Tanto que a primeira parte, focada na condição de Yunjae, na qual ele reflete mais sobre como sua mãe e sua avó construíram o universo particular deles para prepará-lo para o futuro, foi a parte mais intrigante, porque era menos focada nos fatos cotidianos e mais reflexiva sobre seu universo peculiar.

Somada à minha indiferença por Yunjae, existe o fato de que Gon foi um personagem que roubou a cena. Isso, por um lado, é muito positivo, mas também acabou atrapalhando um pouco a conexão com a história como um todo. Explico: o lado bom é que o livro me ofereceu um personagem por quem torcer e por quem me afeiçoar. Gon tem uma origem sofrida e camadas muito instigantes, que mesclam seu coração empático, sua forma reativa de agir, sua violência contra o mundo e seu profundo sofrimento. Ao mesmo tempo que sua primeira aparição o mostra com uma faceta de um típico bully, aos poucos ele revela sua sensibilidade e seu lado mais doce, o que faz dele alguém fascinante e com quem o leitor deseja passar mais tempo. E esse é o lado “negativo”, digamos assim: Gon é tão interessante que eu gostaria de ler uma história todinha sobre ele. Gostaria de saber mais sobre seu relacionamento com o pai, sobre seu ponto de vista da amizade com Yunjae e também seu processo de cura. O problema é que quando Gon não estava em cena e eu precisava voltar minha atenção para Yunjae novamente, eu perdia o interesse e voltava a me arrastar pelas páginas, porque sentia que o carisma da história tinha ido junto com Gon.

Por fim, fiquei decepcionada com o ritmo veloz e o final abrupto da última parte do livro. Tudo acontece de forma súbita e, ademais, temos um desfecho otimista quase surreal de tão repentino, vindo após uma sequência bastante intensa de ação que, por sinal, achei mal escrita e explicada envolvendo Yunjae, Gon e Arame, um antagonista que aparece nos capítulos finais. O epílogo do personagem principal pareceu desencaixado com o que eu havia lido até então, resolvendo tudo de uma forma meio etérea. Contudo, é preciso fazer um disclaimer aqui: essa questão mais pura e otimista do final pode ser uma característica da cultura sul-coreana com a qual eu ainda não estivesse acostumada no momento da leitura. Conforme tenho assistido mais doramas, tenho percebido que isso ocorre também em produções audiovisuais, e aos poucos estou me acostumando mais com algumas escolhas desse estilo. Então achei importante trazer esse adendo pra ponderar minha própria estranheza rs.

Em suma, Amêndoas é um livro com um potencial gigantesco, mas que não funcionou comigo. Senti muita apatia enquanto lia a história, que acabou sendo uma experiência mediana pra mim. Gon foi o grande responsável pelo aspecto positivo da leitura, e foi por ele e por sua relação com Yunjae que eu resolvi dar 3 estrelas quando avaliei o livro no Skoob. Contudo, a sensação que a obra deixou foi bastante agridoce, especialmente levando em conta o hype envolvido em torno do título. E você, já leu Amêndoas? O que achou?

Título original: Almond
Autora:
Won-pyung Sohn
Editora: Rocco
Número de páginas: 288
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Livro cedido em parceria com a editora.
Esse não é um publipost, e a resenha reflete minha opinião sincera sobre a obra.

Resenha: A Volta da Chave – Ruth Ware

Oi pessoal, tudo bem?

Como fã de um bom thriller e tendo tido ótimas experiências com os livros da Ruth Ware, estava ansiosa pra conferir seu novo lançamento, A Volta da Chave. Vamos conhecer? 🗝

Garanta o seu!

Sinopse: Rowan Caine está desesperada. Na prisão, ela enfrenta todos os dias o terror do que viveu e do que lhe aguarda caso não consiga provar sua inocência. É por isso que decide escrever para o famoso dr. Wrexham, conhecido entre as detentas como o advogado das causas impossíveis. O problema é que descrever os acontecimentos que levaram à sua prisão não é uma tarefa nada fácil. Rowan tenta explicar tudo o que aconteceu — desde sua chegada à impressionante Residência Heatherbrae, com o aplicativo que controla as luzes, a geladeira e mesmo as câmeras presentes em cada canto da casa, até as crianças de quem deveria cuidar, muito diferentes da imagem idílica que os patrões de Rowan pintaram durante a contratação. A cada dia que passa, Rowan se vê mais e mais envolvida na atmosfera sufocante. Sozinha com crianças determinadas a afastá-la, sem ninguém mais com quem contar além do caseiro misterioso, a babá começa a ver e ouvir coisas. Apesar de sua personalidade cética, ela não consegue deixar de se perguntar se os rumores que correm pela vila a respeito de assombrações são verdadeiros…

O livro é narrado por meio das memórias de Rowan, uma babá que está aguardando julgamento na prisão, acusada do assassinato de uma das crianças da família Elincourt, pelas quais era responsável. Essas memórias estão sendo transcritas em uma carta para o Sr. Wrexham, conhecido pelas detentas como o “advogado das causas impossíveis”, e Rowan espera que, se for sincera sobre tudo que aconteceu na casa dos Elincourt, ele vá aceitar defendê-la. Esse é o gatilho para Rowan voltar ao passado e relembrar uma experiência que mistura uma sensação de vigilância constante em uma casa inteligente hiperconectada com um passado assombroso repleto de histórias sobrenaturais que assustaram todas as babás que por lá passaram. Teria a morte da criança um motivo inexplicável também? Rowan seria mais uma vítima dessa casa? Ou sua história é uma tentativa vã de construir uma narrativa que a inocente? É em torno dessas perguntas que o livro gira, tentando captar a curiosidade do leitor.

Eu adoro histórias com ambiguidades e também protagonistas não confiáveis, como acontece aqui. Desde o início, Rowan já avisa: ela não é a imagem de babá perfeita, apaixonada por crianças, que sempre faz as escolhas certas e tem a postura ideal. Isso obviamente faz com que o leitor (e, ela supõe, o advogado) tenha um certo pé atrás a respeito de sua inocência, ou seja, a protagonista não ganha a nossa plena confiança logo de cara como um privilégio nato. Porém, aos poucos, conforme ela vai relatando o processo pelo qual ela passou para se candidatar à vaga de babá na casa da família Elincourt, sua entrevista, sua adaptação com as crianças e sua nova rotina na casa, começamos a confiar na sua inocência e acreditar que ela não é uma assassina e que algo sombrio de fato aconteceu lá.

Rowan é contratada por Sandra e Bill Elincourt, ainda que somente Sandra se dê ao trabalho de entrevistá-la. Os dois são arquitetos e reformaram completamente uma mansão vitoriana isolada na Escócia, construindo um espaço anacrônico: enquanto parte da casa manteve o padrão antigo, seguindo à risca os moldes dos séculos passados, outra parte foi simplesmente demolida e reconstruída com o que há de mais moderno na arquitetura. Além disso, tudo no local é conectado a um aplicativo, há câmeras em todos os ambientes e esse mesmo sistema controla do sistema de segurança até a máquina de café. É opressor e sufocante, e Rowan se encanta com essa modernidade ao mesmo tempo que se assusta com ela. Porém, seu desejo de fazer parte daquele mundo é muito maior que qualquer desconforto, e ela aceita o emprego mesmo sabendo das red flags da casa e também das babás anteriores, que se assustaram com algumas lendas urbanas envolvendo mortes ocorridas no local. E aproveito esse parágrafo pra fazer minha primeira crítica negativa ao enredo: Ruth Ware faz uma salada mista aqui cujos sabores simplesmente não se completam de maneira harmoniosa. 

Havia duas opções com potencial aqui: uma delas era ir com tudo em uma história que focasse na problemática do excesso de tecnologia, de como a vigilância constante que uma casa inteligente promove pode ultrapassar limites antiéticos, enfim… há todo um universo que gira em torno desse universo. Por outro lado, há também o lado sobrenatural da história: a mansão tem um histórico de pessoas que morreram nela, existe um jardim no terreno cheio de plantas venenosas que levaram à morte de uma garotinha e que gerou a uma lenda urbana de que o fantasma dela ainda assombra a casa, assim como o fantasma de seu pai, que caminha pela casa arrependido e culpado pela morte da filha (já que ele era um químico que estudava tais plantas venenosas). Essa história também tem muito pano pra manga, e é justamente onde Ruth Ware escolhe focar, portanto o plot da casa inteligente acaba ficando em segundo plano e me causou uma sensação de “poxa vida, então pra quê essa história tá aqui? Precisava mesmo perder tempo com isso? Não podia focar só na parte que importa?”. O mesmo anacronismo da obra que Sandra e Bill fizeram na casa eu senti na construção do enredo de A Volta da Chave, e eu não digo isso como um elogio. :/ 

Outro ponto que infelizmente não me ganhou nesse livro foi a dinâmica de Rowan com as crianças. Sandra e Bill viajam logo que Rowan chega, deixando a babá sozinha com suas três filhas mais novas (Maddie, Ellie e Petra). Chamar de irresponsáveis é pouco, eu diria, mas tudo bem, vamos seguir o baile. Acontece que Rowan parece nunca ter sido babá na vida – o que não é o caso, já que ela trabalhava numa creche. As meninas estão traumatizadas pela alta rotatividade das babás, e isso é compreensível, o que faz com que Maddie e Ellie (as mais velhas) sejam mais resistentes. Mas, independentemente disso, Rowan passa o livro inteiro num embate constante com as meninas, e sempre perdendo todos eles. Ela não consegue exercer sua autoridade em nenhum momento, não consegue controlar as situações e tampouco a narrativa que deve ser reportada a Sandra, o que é enervante. Some isso ao fato de que ela cria um crush no faz-tudo da residência, Jack, e aí o circo está montado: é muuuito difícil visualizar Rowan como uma pessoa competente e que deveria estar exercendo o papel de babá. Ou seja, como leitora, passei a acreditar na inocência dela em relação ao assassinato, mas não tinha total certeza se ela não era alguém despreparada e negligente.

Entrando no aspecto sobrenatural da história, o livro foca bastante em construir o cansaço mental de Rowan. Ela começa a escutar ruídos de passos vindos de uma porta trancada no seu quarto, a qual ela própria não tem a chave, mas que parece dar em um sótão. Além disso, coisas estranhas começam a acontecer, como campainhas tocarem sozinhas, luzes se acenderem, música alta tocar de madrugada, entre outras ocorrências assim. Aí você me pergunta: não pode ser bug do aplicativo? Sim, foi o que pensei, e é por isso que o plot da casa inteligente me incomodou. Pra mim, ele atrapalhou a sensação de medo que o enredo da assombração deveria causar, porque eu ficava me perguntando se não era nenhuma das crianças (Maddie, especialmente, que era mais velha e não gostava de Rowan) aprontando. Até nisso a escolha de misturar as narrativas acabou se atrapalhando. 😦 

Por fim, devo dizer que o final me chocou bastante, e eu gostei muito da escolha de quem morreu e de quem era responsável por isso (só descobrimos essas identidades no final da história, ainda que eu desconfiasse de quem seria a vítima, mas não fizesse ideia de quem seria a pessoa culpada). Achei os motivos bem plausíveis e a forma como aconteceu também, e eu costumo dar pontinhos a mais para os autores quando eles conseguem concluir bem suas histórias. Entretanto, Ruth Ware fez sua protagonista tomar uma decisão que, na minha opinião, era totalmente descabida, pautada em uma conexão que não se sustentava. Selecione a frase seguinte se quiser ler: eu, no lugar de Rowan, jamais sacrificaria o que ela sacrificou pra proteger uma pessoa com quem eu convivi tão pouco tempo, independentemente dos laços sanguíneos. Ela recém havia conhecido aquela pessoa e, de qualquer modo, a justiça não faria nada com ela além de fornecer apoio psicológico. No lugar de Rowan, eu revelaria a verdade. Fim do comentário revelador rs.

A Volta da Chave é um livro com uma premissa que prometeu bastante, mas que não entregou aquilo que eu esperava. Rowan não é uma protagonista cativante. Senti empatia por sua situação e gostaria que ela tivesse um destino positivo em sua tentativa de convencer o advogado por meio das cartas, mas não pude deixar de me irritar com ela em vários momentos ao longo da leitura. Na minha avaliação, Ruth Ware pecou muito ao andar em círculos com sua história, além de misturar duas propostas muito diferentes que “competiram” entre si e não agregaram à obra. Infelizmente, não foi minha melhor experiência com a autora, então sigo recomendando A Mulher na Cabine 10 e A Morte da Sra. Westway – meus favoritos dela – pra quem quiser entrar em contato com sua escrita. 😉

Título original: The Turn of the Key
Autora:
Ruth Ware
Editora: Rocco
Número de páginas: 304
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Livro cedido em parceria com a editora.
Esse não é um publipost, e a resenha reflete minha opinião sincera sobre a obra.

Resenha: As Garotas Que Eu Fui – Tess Sharpe

Oi pessoal, tudo bem?

Após ver muitos elogios no bookstagram, estava com as expectativas bem altas pra ler As Garotas Que Eu Fui, um thriller psicológico com um público-alvo mais adolescente que em breve vai virar filme da Netflix. Vamos conhecer?

Garanta o seu!

Sinopse: O nome dela é Nora… no momento. Ela já foi muitas outras garotas: Rebecca, Samantha, Haley, Katie e Ashley. A vida de mentiras não foi sua escolha, e sim sua herança enquanto filha de uma golpista. A criminosa, cujos alvos sempre foram homens fora da lei, usava a filha como acessório em todos os seus trambiques. Mas quando um dos esquemas da mãe se transformou em paixão, Nora resolveu que era a sua vez de aplicar um golpe e desapareceu. Já faz cinco anos que Nora finge ser normal, mas ela sabe que, na sua vida, as coisas nunca permanecem calmas por muito tempo. Em meio a uma situação que já era esquisita, junto com o ex-namorado e a amiga deles (com quem ela está saindo atualmente), Nora se vê vítima de um assalto a banco. Por um lado, ela sabe que tem a lábia necessária para tirar os reféns vivos dali. Por outro, os assaltantes não sabem quem ela realmente é – uma garota que tem muito a esconder…

Considerando que a sinopse resume bem o cerne da história, vou partir direto para minhas impressões a respeito do livro. A narrativa de Tess Sharpe é bastante ágil, e o primeiro ponto positivo a me chamar a atenção foram os capítulos curtos, que conferem dinamismo à história. Nora, sua namorada Iris e seu ex-namorado/melhor amigo Wes se veem vítimas de um assalto a banco junto de algumas poucas pessoas e toda a história no tempo presente se passa em torno da angústia dos personagens de não saberem se irão ou não sobreviver à situação. Os assaltantes – apelidados por Nora de Boné Cinza, o líder, e Boné Vermelho, o lacaio – são violentos e estão sem máscara, o que a leva a crer que não têm nada a perder. Isso faz com que os instintos de sobrevivência da protagonista se ativem na potência máxima, trazendo seu passado (e sua identidade como golpista) à tona, algo que até então apenas Wes conhecia. Entre o drama de Iris descobrir o seu segredo e Nora tentar enganar os bandidos na lábia, a autora também nos leva à melhor parte da história: os flashbacks das identidades anteriores da protagonista, todas as garotas que sua mãe a obrigou a ser desde a mais tenra idade para auxiliá-la a enganar os piores tipos de homens.

Nora cresceu sendo usada pela sua mãe, Abby, uma mulher que ganhava a vida dando golpes do baú em homens criminosos. E Nora não foi a primeira a ser criada assim: sua irmã mais velha, Lee, veio antes dela, e passou por atrocidades tão ruins quanto. Foi graças a Lee que Nora pôde escapar das garras da Abby, pois ela bolou o plano que permitiu colocar a mãe e o marido atrás das grades e conseguir a guarda da irmã. Esse marido foi a chave para a liberdade de Nora, mas também é a grande ameaça que paira sobre sua cabeça: o nome dele é Robert Keane, um criminoso de grande interesse do FBI, responsável por crimes como assassinatos, chantagem, corrupção, tráfico, etc. Contudo, mesmo da prisão ele ainda exerce grande poder sobre sua rede de contatos, e se descobrir que a enteada ainda está viva, certamente mandará alguém atrás dela para matá-la. Robert foi o único homem que Abby amou, e ela o colocou à frente do bem-estar da própria filha. Ela permitiu que Robert as agredisse, as controlasse e, se ele quisesse, também permitiria que as matasse.

Mas Robert não foi o único homem que marcou a vida de Nora com violência. Inclusive, esse é um gatilho importante de ser mencionado: As Garotas Que Eu Fui é um livro essencialmente sobre abuso. Nora sofreu todos os tipos de violência possíveis, da psicológica à física e à sexual. Mas se você pensa que apenas os homens que eram os alvos dos golpes do baú de Abby foram responsáveis por ferir a protagonista, devo dizer que você está enganado. Talvez a principal pessoa a machucá-la profundamenta seja justamente sua mãe. Considero o abuso parental essencial de ser discutido, porque a influência de Abby é sentida em cada linha e em cada reflexão da narração de Nora. O leitor percebe que a protagonista deseja a aprovação da mãe mais do que tudo na vida, que ela foi uma criança que queria agradar a todo custo, que desejava ser amada e ser fonte de orgulho para Abby, mesmo que fosse tratada como um mero acessório nos golpes. Abby fez com que Nora dissociasse de sua personalidade, forçando-a a ser uma criança que assumia diferentes identidades e características a seu bel-prazer, de acordo com seu objetivo e com o homem que queria conquistar. Pior: Abby permitia que Nora fosse vítima de violências variadas ao longo dos anos, e a fazia se sentir culpada caso não aguentasse suportar alguma delas. O nível de distorção psicológica que isso causa na protagonista é muito profundo, e a autora toma a decisão acertada de mostrar que Nora precisa de ajuda e de muita terapia pra começar a superar essas feridas abertas.

O passado de Nora e as consequências psicológicas do abuso são tão interessantes que acabam tendo um revés meio negativo no livro: o plot do assalto a banco se torna desinteressante. Não existe um verdadeiro plot twist muito marcante nem uma sensação que cause verdadeira aflição nos capítulos em que Nora interage com os bandidos. Eu, pelo menos, não senti nenhuma sensação parecida durante essas cenas. Parte do meu desinteresse com esse plot também envolve meu desinteresse nos personagens envolvidos nele: Iris, por exemplo, eu achei um tédio. Ela é o estereótipo de Manic Pixie Dream Girl e, mesmo que a representatividade bissexual seja um ponto super positivo, não consegui comprar a paixão entre as duas e a química simplesmente não rolou. A conexão com Wes foi muito mais verdadeira, e a autora dedicou muito mais tempo em construir o elo entre Nora e ele do que entre Nora e Iris, por mais que ela tente forçar o amor entre as duas. Wes, além de ter sido o primeiro amor dela e o primeiro homem do qual ela não precisou se proteger, também foi uma pessoa que compartilhou da mesma dor que ela – a dor do abuso parental. A profundidade da relação dos dois me convenceu bem mais e, mesmo como amigos, gostei muito mais da interação deles, o que me fez achar que Iris era um elemento bastante dispensável.

As Garotas Que Eu Fui é um livro que poderia ser um pouco mais curto, especialmente no plot do banco, que achei que se arrastou por tempo demais. Entretanto, gostei muito de toda a história do passado de Nora e da forma como Tess Sharpe trabalhou o enredo de uma criança crescendo como filha de uma golpista e as consequências de ser moldada por uma mãe narcisista. Apesar das frases de efeito de Nora sobre ser perigosa (que por vezes me cansavam um pouco rs), eu gostei bastante dela como personagem. Ela é muito humana, tem empatia, ainda luta contra os próprios traumas e suas reações fazem sentido. Além disso, ela não é idealizada, tendo defeitos e pequenas falhas de caráter que me fizeram gostar ainda mais dela, justamente por mostrar que ela não é perfeita e nem deseja ser. Apesar do final aberto (característica da qual eu não gosto muito), a autora passa uma mensagem clara: Nora está pronta para a luta, assim como a maioria de nós, mulheres, somos ensinadas desde muito cedo a estar. Apesar de não ser um livro inesquecível, gostei muito de conhecer Nora e fiquei orgulhosa de ver quão longe ela chegou no seu processo de cura. 🙂

Título original: The Girls I’ve Been
Autora:
Tess Sharpe
Editora: Rocco
Número de páginas: 352
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Livro cedido em parceria com a editora.
Esse não é um publipost, e a resenha reflete minha opinião sincera sobre a obra.

Resenha: Poemas Tardios – Margaret Atwood

Oi pessoal, tudo bem?

Não costumo ler poesia, mas sair da zona de conforto com Margaret Atwood sempre me parece uma boa ideia. E como 21/03 foi o Dia Mundial da Poesia, também achei super válida a sugestão que recebi no post anterior de falar sobre o tema ainda esse mês pra comemorar. Sem mais delongas, vamos conhecer Poemas Tardios, o livro do de hoje?

Garanta o seu!

Sinopse: Comoventes, lúdicos e sábios, os poemas aqui reunidos falam de ausências e finais, envelhecimento e retrospecção, mas também de presentes e renovações. Eles exploram corpos e mentes em transição, bem como os objetos e rituais cotidianos que nos inserem no presente. Lobisomens, sereias e sonhos surgem ao lado de diferentes formas de vida animal e fragmentos de nosso ambiente danificado. Poemas tardios reúne muitos dos temas mais reconhecidos e celebrados de Margaret Atwood, permeados por descrições minuciosas do mundo natural, passando por encontros espirituosos com alienígenas, situações triviais e divertidas (como guardar passaportes velhos), questões políticas urgentes, lendas, mitos e a sempre obstinada defesa da mulher. Mestre da escrita, Atwood nos lembra de viver o momento e não apenas estar vivos. O mais importante, segundo a autora, é aproveitar todos os dias, seja esculpindo lanternas de Halloween em abóboras, fazendo sexo ou simplesmente lembrando-nos de ver os cogumelos de setembro brotarem.

Poemas Tardios reúne poesias que Margaret Atwood escreveu entre 2008 e 2019. De modo geral, elas permeiam temas como feminismo, opressão feminina, passagem do tempo, envelhecimento, natureza e alguns outros assuntos mais abstratos e aleatórios que não se encaixam tão bem em “categorias” específicas. Os poemas são divididos em 5 partes,  e em sua maioria são curtos e fluidos (do jeitinho que eu gosto), com poucas exceções mais longas.

Os assuntos que mais ressoaram em mim foram justamente aqueles que falavam sobre gênero e sobre a passagem do tempo. Em contrapartida, poemas mais “aleatórios” devo confessar que acabei lendo sem muita atenção, meio que passando as páginas rapidamente pra “acabar logo”. Se é apenas falta de paciência ou sensibilidade de minha parte, aí deixo o julgamento pra vocês, porque não ligo muito não rs. Inclusive, nos próximos parágrafos prefiro focar meus esforços em discorrer sobre meus poemas favoritos, e fico na torcida de que, a partir deles, eu possa inspirá-los a conferir essa coletânea também. 😉

Na Parte 1, temos “Sal”, um poema muito bonito que fala sobre olhar para trás, para um tempo passado no qual diversas coisas boas aconteceram, ainda que naquela época você não conseguisse reparar que tais coisas boas estivessem ocorrendo. É um poema que evoca nostalgia. Temos também “Nevasca”, meu poema favorito dessa primeira parte, que narra uma filha olhando para a mãe envelhecida na cama e imaginando que ela esteja vivendo aventuras em seus sonhos, aventuras estas que permitam que ela saia da opressão de estar presa na cama e entre as quatro paredes de seu quarto. Ao mesmo tempo, a parte mais dolorosa desse poema reside na reflexão dessa filha sobre o próprio apego, ao perceber que a vida da mãe deve ser muito melhor em seus sonhos, mas ainda assim essa filha sente tanta dificuldade em permitir que ela parta.

Na Parte 2 do livro, “Roupas de princesa” é uma alegoria que utiliza diferentes situações, peças de roupa e tecidos para evidenciar a falta de liberdade e adequação feminina a qualquer situação. Não importa a maneira como estamos vestidas, a opressão sempre se faz presente e estamos suscetíveis a julgamentos e violências em todos os âmbitos. “Vista-se assim”, “vista-se assado”: não importa, nossas vidas sempre estão em jogo. Ainda nessa temática, “Sombra” é um poema que coloca o corpo feminino como um bem a ser desejado. O poema gira em torno da mulher ser objetificada e, quando não nos resta mais nada a oferecer, até mesmo a nossa sombra vira um alvo. Por último, mas não menos importante, temos minha série favorita no livro: “Canções para as irmãs assassinadas”. Trata-se de uma série poderosa de poemas que conta a história de tantas irmãs, tantas mulheres assassinadas pelo ódio e pela pequenez masculina, assim como a revolta, o luto e a dor que isso deixa pra trás. Foi certamente a sequência mais intensa e que mais mexeu comigo ao longo das páginas.

As Partes 3 e 4 da obra falam (e divagam) bastante sobre a natureza, mas de modo geral não gostei tanto dos poemas. A exceção à regra está na “Sequência do Plasticeno”, que, como “Canções para as irmãs assassinadas”, trata-se de uma série que fala sobre o momento atual do nosso planeta, em que tudo gira em torno do exagero na produção de plástico e em como isso afeta profundamente o equilíbrio da natureza, assim como ameaça o nosso futuro. Essa sequência é bem bacana e promove uma reflexão atual e necessária, sendo o ponto alto da temática natural, na minha opinião. Temos, na Parte 5, alguns poemas que trazem assuntos permeando envelhecimento, natureza e devaneios abstratos, e não gostei de nenhum poema em especial.

Em suma, considero Poemas Tardios uma ótima coletânea de poesia, que mostra um lado de Margaret Atwood que eu ainda não conhecia, mas com o qual gostei muito de entrar em contato. Eu já a admirava como escritora de romances e agora também a admiro como poetisa, pois é nítida sua habilidade de permear por diferentes estilos com maestria. Ainda que eu não tenha amado todos os poemas, acho que isso é natural numa coletânea, e temos que avaliar a obra como um todo. Se você curte poesia, vale a pena conferir. 😀

Título original: Dearly
Autora:
Margaret Atwood
Editora: Rocco
Número de páginas: 176
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Livro cedido em parceria com a editora.
Esse não é um publipost, e a resenha reflete minha opinião sincera sobre a obra.

Resenha: Um Homem Chamado Ove – Fredrik Backman

Oi pessoal, tudo bem?

O post de hoje é bem especial, pois trata-se do meu último livro favoritado: Um Homem Chamado Ove, de Fredrik Backman – autor de Gente Ansiosa, que inclusive foi meu favorito de 2021. ❤

Garanta o seu!

Sinopse: À primeira vista, Ove é muito provavelmente o homem mais rabugento que você já conheceu. Mesquinho, teimoso, cheio de manias e com um temperamento ruim, ele acredita estar cercado por idiotas – esportistas sorridentes e lojistas que falam em código, sem mencionar os golpistas que o expulsaram da presidência da associação de moradores do bairro. As pessoas o consideram um homem amargurado… Mas só porque ele não anda por aí sorrindo o tempo todo, falando o que todos querem ouvir, e fica em silêncio quando não tem nada a dizer, isso significa que é amargo? Certa manhã de novembro, o mundinho organizado e solitário de Ove é abalado pela chegada de novos vizinhos. Um casal jovem e simpático que, com as duas filhas barulhentas, anuncia sua presença ao derrubar a caixa de correio de Ove com o caminhão de mudanças. O que se segue é uma divertida e cativante história sobre gatos desgrenhados, amizades improváveis e descobertas inesperadas.

Começo essa resenha com um aviso importante: existe um gatilho relacionado a suicídio que permeia toda a história, então é importante que você reflita se esse livro é pra você, tá bem? Agora, vamos à resenha. Ove é um senhor de 59 anos que está profundamente deprimido. Ele perdeu sua esposa há 6 meses, e ela era a verdadeira luz de toda a sua vida, a pessoa que dava sentido a cada um de seus dias. O único conforto que Ove tinha após a partida dela era a sensação de utilidade proporcionada pelo trabalho, mas quando ele é dispensado contra sua vontade isso também lhe é tirado. Com a criação e o contexto no qual o protagonista cresceu, sentir-se inútil à sociedade foi um baque muito forte para lidar junto ao luto. Por isso, a decisão mais lógica lhe parece óbvia: juntar-se à esposa, Sonja, por meio de um suicídio limpo e organizado. Acontece que, ao longo do livro, Ove passa a ser teimosamente interrompido pela vida – e quando digo vida, a ênfase está no novo casal de vizinhos, concentrada na figura da matriarca, Parvaneh, uma iraniana de 30 anos cuja personalidade expansiva, contagiante e, ainda assim, curiosamente parecida com a de Ove, que parece determinada em aparecer nos momentos mais inoportunos para atrapalhar os planos do protagonista. Com o passar das páginas, o mau-humor e a rabugice de Ove vão sendo confrontados pelas pessoas que o cercam, e o leitor também vai entendendo um pouquinho mais de seu passado e dos motivos que o levaram a ser alguém mais fechado e isolado.

A primeira coisa que preciso elogiar em Um Homem Chamado Ove é a narrativa. A escrita de Fredrik Backman é cativante de um jeito que nem sei explicar. A forma como ele narra as coisas, encaixando sarcasmo aqui e ali, me fisga desde a primeira frase, e isso também aconteceu lá na leitura de Gente Ansiosa. O autor nos conduz entre passado e presente, narrando em terceira pessoa de uma forma cheia de personalidade que lembra uma espécie de primeira pessoa. Por exemplo, em vez de dizer que Ove não gosta de determinada atitude, a narrativa diz “não é que Ove não goste de tal atitude, longe disso. É que…”, sabe? Então isso confere um tom de conversa e de “parcialidade” à narrativa que também torna a forma de contar histórias do autor muito característica. Eu adoro! ❤️

Ove é aquele estereótipo de “meu malvado favorito”: ele é turrão e rabugento, não tem paciência com ninguém e não faz questão de agradar. Porém, quando conhecemos suas origens, descobrimos que seu passado foi muito difícil e que ele tem motivos pra ser como é. Gente, sabe o meme da Paris Hilton de que tudo de ruim que pode dar errado com uma pessoa aconteceu com ela? É o Ove todinho. Ele perdeu os pais muito jovem, sofreu um golpe de um estelionatário, perdeu uma casa, enfim… uma série de tragédias. Isso pra não entrar no mérito das tristezas familiares que acometeram seu casamento, mas nem quero dar muitos detalhes porque isso faz parte da emoção da história. Contudo, é muito bonito perceber o quanto ele foi feliz e grato pela oportunidade de ter conhecido e convivido com Sonja. Apesar dela já ter partido quando a história começa, sua presença é palpável ao longo do livro inteiro: Sonja trazia cor para o mundo preto no branco de Ove, era a única que conseguia fazê-lo rir e era a pessoa por quem ele lutava até suas últimas forças. O amor dos dois é tão inspirador que é impossível não derramar lágrimas em diversas passagens do livro, principalmente quando ele visita seu túmulo e expõe a saudade que sente dela.

Apesar do tom triste da história de Ove, Fredrik Backman domina a arte de equilibrar cenas de drama com alívios cômicos. Em um momento eu estava chorando e, no parágrafo seguinte, o autor me fazia rir. A interação de Ove com os vizinhos é sensacional e, aos poucos, ele vai “ganhando utilidade” novamente, se envolvendo nos dilemas das pessoas – contra a sua vontade, importante frisar – e auxiliando-as com seus problemas. Porém, fiquei triste ao pensar que Ove dependa tanto desse sentimento de utilidade pra interromper os seus planos suicidas. É um reflexo de uma baixa autoestima e da pressão capitalista de que só temos valor quando servimos para algo, e não pelo que somos, e eu passei o livro todo torcendo pra vê-lo se libertar disso. Felizmente, conforme ele vai ajudando os vizinhos e se aproximando deles, os vínculos também vão se estreitando e acabam se transformando em verdadeiras amizades – e esse é o ponto de virada pra que Ove finalmente sinta uma motivação genuína pra viver novamente (ou melhor, para adiar seu reencontro com Sonja).

Um aspecto que eu gosto muito nos livros de Fredrik Backman e que novamente identifiquei em Um Homem Chamado Ove é em como ele encaixa informações importantes quando menos esperamos. Ainda que os personagens secundários tenham pouco espaço na trama – e isso possa ser lido como um dos pontos mais fracos da obra, afinal, eles poderiam ter mais desenvolvimento –, o autor conseguiu escolher os personagens ideais para serem aprofundados ou para terem detalhes sobre seu passado incluídos na história no momento certo. Rune, por exemplo, é o vizinho e rival de Ove, que “roubou” seu lugar como diretor da associação de moradores. Outrora amigos, os dois pararam de se falar há anos, mas agora Rune enfrenta o Alzheimer e é uma sombra do homem que um dia Ove conheceu. Porém, é por ele que Ove resolve assumir uma das maiores lutas do livro, o que mostra quão nobre e correto é o caráter do protagonista, que até então poderia ser erroneamente interpretado como egoísta pelos vizinhos (e até por leitores desatentos).

Outro personagem por quem você “não dá nada” é Jimmy, que passa pela história sem deixar grandes marcas, até que Fredrik Backman insere a sua origem no bairro de uma maneira tão singela e emocionante que me peguei chorando intensamente ao perceber como tudo aconteceu e o papel de Ove e Rune em sua história. É isso que mais amo nas histórias de Fredrick Backman: tudo gira em torno dos personagens e das relações entre eles, e é isso que faz com que eu me apaixone por um livro. Até mesmo o gato de rua “todo estropiado” (palavras de Ove rs) tem personalidade e cumpre um papel fundamental na mudança de Ove, sendo adotado pelo protagonista de forma inusitada e fazendo toda a diferença na sua rotina. 

Um Homem Chamado Ove é um livro maravilhoso sobre perda e luto, mas também sobre amor verdadeiro, sobre valorizar cada oportunidade de estar vivo e, principalmente, sobre as pessoas que encontramos pelo caminho. Ao se relacionar com Parvaneh e seus vizinhos, Ove relembra como é sentir a conexão com outros seres humanos, algo que desde a partida de Sonja estava adormecido dentro dele. No fim, isso é tudo que temos: o amor uns pelos outros e a marca que deixamos no coração das pessoas. Posso dizer com convicção que Ove deixou uma marca profunda no meu.

Título original: A Man Called Ove
Autor:
Fredrik Backman
Editora: Rocco
Número de páginas: 320
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Livro cedido em parceria com a editora.
Esse não é um publipost, e a resenha reflete minha opinião sincera sobre a obra.

Resenha: Flores Feitas de Espinhos – Gina Chen

Oi pessoal, tudo bem?

A primeira leitura do ano foi uma fantasia incrível que eu estava louca pra dividir com vocês: Flores Feitas de Espinhos, da autora estreante Gina Chen.

Garanta o seu!

Sinopse: Violet é uma vidente e uma mentirosa que influencia a corte com profecias cuidadosamente formuladas — e nem sempre verdadeiras. Honestidade é para os otários, como o nem-tão-encantado príncipe Cyrus, que planeja destituí-la de seu cargo assim que assumir a coroa, no fim do verão. A menos que ela faça algo a respeito. Mas quando o rei pede que ela invente uma profecia sobre Cyrus encontrar seu verdadeiro amor no próximo baile, Violet sem querer dá início a uma temida maldição, que pode tanto destruir quanto salvar o reino — dependendo de quem o príncipe escolher como futura esposa. Ela então precisa encarar as próprias opções: aproveitar a oportunidade de controlar seu destino, a qualquer custo, ou ceder à perigosa atração que vem crescendo entra ela e Cyrus. Sua esperteza pode protegê-la das tramas cruéis da corte, mas não pode mudar seu destino. Conforme a linha entre ódio e amor se embaça, Violet deve desvendar uma terrível teia de enganações para salvar a si mesma e ao reino… ou condenar a todos.

Como não gosto dessa sinopse, vou resumir a história com minhas próprias palavras pra vocês: Violet é uma garota com o poder da Visão, capaz de enxergar os fios do passado e do futuro, o que faz com que ela exerça o papel de Vidente do rei de Auveny, um dos reinos mais prósperos do Continente Solar. Porém, mesmo com o reino em paz, uma profecia proferida pela Vidente que ocupou o cargo antes dela assombra a todos: ela diz que o coração do príncipe será responsável pela danação ou pela maldição do reino, pois guerra, sangue e rosas estão a caminho. O prazo limite da profecia se aproxima, a Floresta Feérica (uma floresta mágica que faz divisa com o reino e onde residem as fadas) está apodrecendo, e Cyrus, o príncipe, não está nem perto de encontrar uma noiva. Tudo isso leva seu pai, o rei Emilius, a pedir a Violet que proclame uma profecia falsa sobre o verdadeiro amor de Cyrus ser encontrado no baile que o ocorrerá no palácio. As consequências de mexer com o destino passam a pesar nos ombros da jovem, do príncipe e de todos aqueles que residem em Auveny.

Eu gostei de cara de Flores Feitas de Espinhos por causa de Violet. Ela é sarcástica e tem a língua ferina de um jeito perspicaz e genuinamente engraçado, o que me fez sorrir enquanto lia algumas frases debochadas que ela usava pra se referir sobre pessoas ou situações. Seus pensamentos são cínicos e pragmáticos, talvez um pouco pessimistas, mas aos poucos o leitor vai entendendo o motivo de sua casca ser tão grossa e impenetrável. A protagonista ficou órfã antes mesmo de sua mãe lhe dar um nome, então tudo que ela aprendeu foi com e nas ruas do Distrito Lunar, o mais pobre da Capital Solar, e essa criação a tornou desconfiada – mas também independente. Para completar o panorama de sua personalidade, Violet transborda de teimosia e orgulho, que são as partes mais difíceis de lidar da personagem. Apesar disso, o balanço geral a respeito de Violet é de que ela é uma ótima protagonista, bem atrevida e dona de si, e eu criei simpatia por ela sem demora. Além disso, também criei empatia: por mais que Violet diga que prefere o isolamento e afirme não se importar com ninguém, aos poucos fica nítido que a personagem gostaria de acolhimento e aceitação, o que também nos faz torcer ainda mais por ela.

Cyrus, por sua vez, é sua contraparte total: o príncipe é idealista, honrado e – por que não dizer? – charmoso, daquelas pessoas que sabem que são bonitas e usam seus “dotes” pra deixar todo mundo mais confortável e à vontade. Isso enerva Violet, que o enxerga como um hipócrita. Ele, por sua vez, se ressente dela devido às mentiras que ela por ventura conta a pedido do rei. Os dois juntos funcionam como um barril de pólvora que você sabe que vai estourar a qualquer momento, mas fica o aviso: é necessário ter paciência, porque o óbvio romance estilo enemies to lovers demora bastante a engrenar. Os dois se conhecem desde pequenos, após Violet salvá-lo e ele apresentá-la ao pai, e existe uma mágoa bastante grande de ambas as partes pela forma como o relacionamento transcorreu ao longo dos anos.

Gostei muito do fio principal da história, girando em torno da maldição. O livro mescla elementos de vários contos de fada, como por exemplo a Cinderela (na profecia mentirosa da Violet), A Bela e a Fera (com as rosas e as Feras que ameaçam o reino a partir do apodrecimento da Floresta Feérica) e até referências mais simples que aparecem em ditados populares como “tão confiável quanto uma casa feita de doces”. São pequenos detalhes que tornam a experiência de leitura muito divertida, porque você fica com aquela reação de “ahá, peguei essa referência!”, sabem? 😂 Além disso, conforme o prazo da maldição se aproxima, o livro ganha um senso de urgência maior. A vilã por trás dos acontecimentos vem ameaçando Violet ao longo de toda a história, até que finalmente faz a sua estreia e causa uma série de consequências devastadoras – a principal delas sendo a instabilidade causada na mente de Violet.

Como pontos negativos, eu traria a duração do livro (que poderia ser um pouquinho mais objetivo), e também a falta de visão sobre os pensamentos e atitudes de Cyrus, para que ele fosse mais do que “apenas o Príncipe Encantado amaldiçoado”. Acredito que a trama ganharia em profundidade caso os capítulos fossem alternados entre a narração dele e dela, até porque, no meu ponto de vista, isso nos ajudaria a entender o romance um pouco melhor. As cenas entre os dois são muito mais atreladas a tesão do que a amor, então fica bem difícil “comprar” o discurso de homem apaixonado de Cyrus quando isso acontece. Se tivéssemos acesso a seus anseios e angústias, talvez ficasse mais fácil compreender porque Cyrus toma atitudes tão contraditórias em diversos momentos da trama.

Flores Feitas de Espinhos foi uma ótima leitura pra começar o ano. O livro é uma mistura deliciosa de contos de fada com Disney e Once Upon a Time, trazendo uma visão própria a vários elementos conhecidos e unindo todos eles em uma história que tem um fio condutor bem instigante. Recomendo!

Título original: Violet Made of Thorns
Autora:
Gina Chen
Editora: Rocco
Número de páginas: 384
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Livro cedido em parceria com a editora.
Esse não é um publipost, e a resenha reflete minha opinião sincera sobre a obra.

Resenha: Amanhã, Amanhã, E Ainda Outro Amanhã – Gabrielle Zevin

Oi gente, tudo bem?

Começo esse post com uma pergunta: é possível não se identificar completamente com um livro, não gostar de metade dele, mas ainda assim se emocionar profundamente? Amanhã, Amanhã, E Ainda Outro Amanhã me mostrou que sim.

Garanta o seu!

Sinopse: Em um dia congelante de dezembro, no seu terceiro ano em Harvard, Sam Masur sai do metrô e vê, entre uma horda de pessoas esperando na plataforma, Sadie Green. Ele a chama. Por um momento, ela finge não ouvir, mas então se vira, e um jogo começa: uma colaboração lendária que vai levá-los ao estrelato. Esses amigos, próximos desde a infância, pegam dinheiro emprestado, pedem favores e, antes mesmo de se formarem, lançam seu primeiro sucesso, Ichigo. De um dia para o outro, o mundo é deles. Com menos de vinte e cinco anos, Sam e Sadie são brilhantes, bem-sucedidos e ricos, mas essas vantagens não vão protegê-los de suas próprias ambições criativas e das traições do coração. Abarcando mais de trinta anos da vida dos protagonistas, de Cambridge à Califórnia, passando por lugares distantes, reais e virtuais, Amanhã, amanhã, e ainda outro amanhã é uma história intrincada, imaginativa e tocante que examina a natureza múltipla e complexa de nossos fracassos, identidades e deficiências, das possibilidades redentoras dos jogos e, acima de tudo, de nossa necessidade de conexão, de amar e sermos amados. Sim, é uma história de amor, mas diferente de tudo que você já leu.

A trama acompanha a amizade cheia de altos e baixos de Sam e Sadie desde os 12 e 11 anos até a faixa dos 35 e 36, aproximadamente. Eles se conhecem no hospital, mais especificamente na sala de videogames, e o amor em comum pelos jogos é a faísca para uma amizade profunda. Um mal-entendido leva ao afastamento dos dois, mas eles se reencontram novamente na faculdade e resolvem criar um jogo juntos. Quem apoia a empreitada é Marx, o colega de quarto de Sam, que cede o apartamento em que moram pra que a dupla possa passar dias (e noites) a fio criando, enquanto Marx auxilia com tudo que eles precisam pra que o trabalho possa continuar. O resultado é Ichigo, um jogo que alavanca suas carreiras e vira um sucesso instantâneo, levando a dupla ao estrelato e possibilitando não apenas uma mudança financeira substancial, como também a criação da Jogo Sujo, a empresa de games que fundam junto com Marx. Mas trabalhar com seu melhor amigo pode também ser uma armadilha perigosa para ressentimentos, mágoas, divergências e outros tantos sentimentos difíceis de lidar – nenhum deles é poupado por Gabrielle Zevin.

Eu já gostei muito de jogos e videogames, mas faz um tempo que não me identifico tanto com o tema. Por isso, até a metade do livro, tive dificuldade de me engajar com a história e fui empurrando com a barriga. A trama é lenta, já que acompanha o processo criativo dos personagens, algumas discussões mais técnicas sobre programação e a passagem do tempo de forma gradual, então isso também não favoreceu que eu engatasse de vez a leitura. Se isso acontecer com você, siga meu conselho: insista mais um pouco, pois será recompensado com um livro profundo sobre relações humanas e sentimentos intensos.

Sam e Sadie se amam, mas são cheios de defeitos. Sam tem a autoestima muito abalada por ser um garoto deficiente, o que o torna muito fechado e inacessível. Ele não se coloca numa posição de vulnerabilidade nem com seus melhores amigos, e enquanto Marx consegue levar isso numa boa, Sadie fica um pouco magoada por não saber se os sentimentos de amor e amizade dele são recíprocos. Além disso, por mais que finja que não, Sam usufrui dos benefícios do machismo para brilhar, enquanto sua parceira é escanteada. A sementinha do ressentimento que vai fazer com que Sadie crie um verdadeiro rancor em relação a Sam vem, inclusive, dessa dinâmica de poder: Sadie é uma mulher num mercado majoritariamente masculino em 1996, ou seja, o espaço dado a ela é ínfimo e ela precisa abrir seu caminho com um facão. É claro que Sam se tornar a cara da Jogo Sujo e deixá-la de lado piora essa situação. Existem outros motivos por trás de sua mágoa, mas não vou aprofundá-los aqui porque acho importante ir descobrindo essas camadas durante a leitura. O que é importante saber é que Sadie representa aquelas pessoas que veem seu trabalho ser atrelado a todo mundo, menos a elas, e que é esmagada pelo peso da frustração em relação a isso. Não são sentimentos bonitos, mas são reais e fáceis de se identificar.

Marx é a cola que mantém o grupo unido. Leve, sensato, altruísta e compreensivo, ele é o produtor da Jogo Sujo, mas seu papel vai muito além disso: ele sabe das dificuldades de Sam e faz de tudo para melhorá-las sem que o amigo precise pedir; ele ameniza as brigas entre Sam e Sadie, mostrando pra ambos (de forma separada) que um faria absolutamente tudo pelo outro; ele tem uma visão de negócios afiada tanto para administrar a Jogo Sujo quanto pra encontrar novos talentos para a equipe… eu poderia ficar horas falando sobre as muitas qualidades de Marx. Pra ser sincera e imparcial, ele é quase perfeito demais. Mas, como os próprios personagens que o conhecem afirmam, é realmente impossível não gostar de Marx. Eu me apaixonei por toda a sua trajetória e me emocionei com todos os aspectos que envolvem o plot focado nele.

Gabrielle Zevin também acerta ao trazer temas universais e importantes pra dentro da trama com naturalidade. Ela aborda a deficiência física de modo ambientado e contextualizado; ela fala sobre relações abusivas por meio de Sadie e sua dependência emocional em relação a um professor mais velho; ela fala sobre o perigo do acesso às armas e as consequências letais dessa política; ela fala sobre relacionamentos homoafetivos e a injustiça envolvendo a impossibilidade de casamentos na Califórnia entre casais do mesmo sexo; ela fala sobre depressão e saúde mental, entre outras questões. Mesmo que pareça que são muitos temas a serem abordados, eles são pequenas partes do enredo ou características dos personagens, então em nenhum momento a história força para um ou outro assunto, ao mesmo tempo em que trata de todos eles de forma verossímil e séria.

Como críticas negativas, os aspectos que não funcionaram tão bem pra mim foram os “vai e vem” temporais, porque costumo me perder em tramas que fazem isso em demasia, e também o final levemente apressado. A relação de Sam e Sadie estava desgastada de uma forma quase irreversível, mas as páginas finais fazem com que a reaproximação dos dois seja meio afetuosa demais – especialmente quando consideramos quanto tempo Sadie passou renegando qualquer contato com Sam. Ainda assim, é possível tirar uma lição bonita desse final apressado, já que ele é essencialmente otimista e mostra como o tempo realmente tem um poder de cura muito valioso.

Amanhã, Amanhã, E Ainda Outro Amanhã começou como um livro que eu mal tinha vontade de pegar pra ler e, da metade em diante, se transformou numa obra que me levou às lágrimas, mexeu com meu coração, me fez sentir a dor dos personagens, me fez sentir identificação com suas frustrações e tirou o meu sono, de tanto que fiquei pensativa após sua conclusão. É um livro que usa o universo dos jogos pra levantar questões sobre a imprevisibilidade da vida, sobre as mudanças de percurso e sobre a força de recomeçar. Ainda que não tenhamos vidas infinitas como os personagens dos jogos, de certa forma cada dia é uma nova oportunidade de dar o play e fazer o nosso melhor. Por isso e por muito mais, esse livro entrou na lista de favoritos do ano. ❤

Título original: Tomorrow, and Tomorrow, and Tomorrow
Autores:
Gabrielle Zevin
Editora: Rocco
Número de páginas: 400
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Livro cedido em parceria com a editora.
Esse não é um publipost, e a resenha reflete minha opinião sincera sobre a obra.

Resenha: Sobre Amor e Estrelas (E a Cabeça Nas Nuvens) – Clara Alves, Lia Rocha e Olívia Pilar

Oi pessoal, tudo bem?

Enquanto a apuração dos votos do segundo turno acontece e o meu estômago fica completamente embrulhado de ansiedade, resolvi me distrair um pouco falando sobre uma leitura bem leve pra ajudar a dissipar um pouco da aflição. Além disso, outubro foi o mês do meu aniversário, por isso a libriana aqui que adora comemorar escolheu conferir a terceira edição da série Sobre Amor e Estrelas, que aqui se complementa com o título E a Cabeça Nas Nuvens. Nesse volume, os signos protagonistas são Libra, Gêmeos e e Aquário.

Garanta o seu!

Sinopse: Ao encontrar um emprego em uma lojinha esotérica, HANNAH, uma libriana bem cética, vai perceber que uma mãozinha do destino é sempre bem-vinda. Com a relação difícil com o pai, que não aceita quem ela é de verdade, Hannah vai precisar acreditar muito em si mesma para ter a coragem de se impor. E quando se vê acidentalmente em um triângulo amoroso, ela sabe que não adianta mais postergar: é hora de agir. Como boa aquariana, JULIETA tem dificuldade em lidar com sentimentos fortes, e sua primeira reação é mergulhar no trabalho e nos projetos sociais em que atua para fugir das emoções. O problema é que, meses depois do término, ela precisa se unir ao ex-namorado para juntar um casal querido. É aí que Jut percebe que a revolução que quer ver no mundo começa dentro dela, e agora vai ter que correr atrás para consertar seus erros. TATIANA terminou um relacionamento recentemente e não se reconhece mais. Para a geminiana que sempre achou fácil se relacionar com todo tipo de gente, mas difícil se concentrar no que quer, é complicado se livrar dos rótulos que aprendeu a considerar negativos. Com um pouco de ajuda, Tatiana vai começar a ver o melhor de si e até mesmo dar chance a um romance que não parece muito compatível. Inspiradas nos signos mais inteligentes, sociáveis e criativos do zodíaco, as autoras Clara Alves, Lia Rocha e Olívia Pilar contam três histórias baseadas nos signos de libra, aquário e gêmeos.

Assim como os outros volumes da coleção, a obra é dividida em três contos focados nos signos. O que me deixou mais animada pra conhecer esse livro foi a participação de Clara Alves, que escreveu o fofíssimo Conectadas e, é claro, o fato de focar em uma personagem do meu signo (libra). De maneira geral, os livros da série Sobre Amor e Estrelas não são muito marcantes, trazendo romances mais simples e sem grande aprofundamento. Isso faz com que eu não me torne fã da coleção, mas ao mesmo tempo não posso dizer que é ruim ler os volumes. E a Cabeça Nas Nuvens é um bom exemplo de leitura fácil, que vai fluindo e você nem percebe, ainda que as histórias não sejam “uau, que incrível”. Vale também salientar como ponto mega positivo que todas as histórias de Sobre Amor e Estrelas (E a Cabeça Nas Nuvens) são repletas de representatividade negra e LGBTQIA+. 

O primeiro conto se chama Desequi(libra) e foi meu favorito. A protagonista é Hannah, uma menina LGBTQIA+ oriunda de uma família evangélica super conservadora. Ela tem uma relação complicada com os pais por conta disso e sonha em conquistar independência financeira. Porém, cética como ela é, esse universo de signos e misticismo é uma bobagem – o que não a impede de pedir emprego numa loja esotérica. Hannah rapidamente faz amizade com a dona da loja ao mostrar que é inteligente e dedicada, mas um erro cometido na leitura de um mapa astral deixa a garota em pânico de contar a verdade. Tá, e o romance, cadê? Calma que vou chegar lá. O mapa astral que Hannah erra é o de Thalita, uma garota que está acompanhando a melhor amiga, Lis, num campeonato de surfe no Rio de Janeiro (onde a história se passa). Hannah crusha na garota quase que instantaneamente, mas Thali está a fim da melhor amiga. O livro gira em torno dos dois dilemas da protagonista: 1) ela vai confessar seus sentimentos? 2) Ela vai contar a Thali que errou na impressão do mapa astral? Esse conto é aquele tipo de história que daria facilmente uma comédia romântica cheia de trapalhadas, na qual a protagonista se afunda cada vez mais na própria confusão, o que tornou a leitura bem divertida. Meu único problema com esse tipo de plot é que já tô velha demais pra situações que poderiam ser resolvidas com uma simples conversa. 😂

O segundo conto, Tecido Pelas Estrelas, é focado em Julieta, uma professora que terminou um namoro há alguns meses e colocou toda a energia no trabalho e nos projetos sociais que ajuda. Não fica claro o motivo do término até a porção final do livro, mas o leitor já percebe que Jut sofreu bastante com a decisão e não superou 100% a situação. Sua vida dá uma guinada surpreendente ao descobrir que suas mães, donas de um atelier de moda famoso, estão se divorciando, e o clima no ambiente tem estado cada vez mais tenso. É aí que o ex de Julieta entra em cena: Leonardo trabalha no atelier e quer ajudar na reconciliação das suas chefes. Os dois resolvem fingir que voltaram a namorar pra terem desculpas de promoverem encontros familiares para que as mães de Jut voltem a conversar; o problema é que Leo está magoado com o término e logo fica claro que o plano tem machucado o coração de ambos. Julieta é representante do signo de aquário, então o conto dela é focado no dilema dela conseguir ser mais aberta emocionalmente e admitir que deseja Leo de volta.

Por fim, temos a história de Tatiana no conto Duas de Mim. Depois de passar por um término com a ex-namorada, a geminiana Tati se enclausurou em casa e nos estudos, evitando novos encontros sociais – algo bem atípico, de acordo com seu signo. Sua irmã mais velha e seu cunhado passam a insistir que a garota se exponha ao mundo novamente, preocupados com o comportamento não usual de Tati, que costumava ser falante e extrovertida. Eles propõem que a garota aceite os encontros a cegas que o casal tem em mente, e logo de cara as coisas não saem como o esperado, quando a protagonista conhece Camila, com quem tem química zero. O encontro foi constrangedor, não fluiu e fez Tati ficar bastante incomodada. Porém, em outra ocasião, Tati encontra a menina novamente enquanto andava de bike e as duas começam a conversar. O papo flui e a química acontece, para surpresa total de Tatiana. Porém, Camila está vivendo um período difícil e isso atrapalha bastante a relação entre as duas, e o conto gira em torno de deixar o leitor curioso pra saber se elas conseguirão superar esses desafios ou não. Esse foi o conto de que menos gostei, porque achei Tatiana e Camila bem chatinhas como personagens e não consegui torcer pelo romance – diferente das outras duas histórias, cujas protagonistas e pares românticos são mais simpáticos.

Sobre Amor e Estrelas (E a Cabeça Nas Nuvens) é uma boa pedida pra quem busca entretenimento fácil e/ou se identifica com a temática de signos. Ainda que em alguns momentos as autoras forcem a conexão com o horóscopo (pra ser sincera, eu só achei natural a forma como Clara Alves trabalhou o tema), quem curte o assunto pode achar divertido ver as características sendo trabalhadas ao longo das histórias. Não é uma leitura inesquecível mas cumpre seu papel de entreter por algumas horas. 😀 

Título original: Sobre Amor e Estrelas (E a Cabeça Nas Nuvens)
Série: Sobre Amor e Estrelas
Autores:
Clara Alves, Lia Rocha e Olívia Pilar
Editora: Rocco
Número de páginas: 240
Gostou do livro? Então adquira seu exemplar aqui e ajude o Infinitas Vidas! ❤

Livro cedido em parceria com a editora.
Esse não é um publipost, e a resenha reflete minha opinião sincera sobre a obra.

Resenha: Rua do Medo – R. L. Stine

Oi pessoal, tudo bem?

Hoje a dica é bem nostálgica, porque é a resenha de um livro que me levou pros meus tempos de criança, em que eu pegava livros na biblioteca da escola. O título em questão é Rua do Medo, do R. L. Stine, autor da série Goosebumps e de inúmeros títulos da própria série Rua do Medo, que é enorme rs. A Editora Rocco reuniu três desses títulos em um livro só e, apesar de fazerem parte da mesma série, são histórias independentes. Outro ponto legal de ressaltar é que Rua do Medo inspirou os filmes da Netflix, mas eles não são adaptações dessas histórias sobre as quais falaremos aqui, belê? Agora partiu conhecê-las!

Garanta o seu!

Sinopse: Não leia à noite!!! Edição especial em capa dura e com fitilho, reunindo três das histórias mais aterrorizantes da série que inspirou os filmes de sucesso da Netflix.

Começo essa resenha elogiando a edição física do livro, que está caprichadíssima. Eu tinha na memória as capas breguíssimas e antigas da série Rua do Medo, Casa do Pesadelo e Goosebumps, então foi um colírio ver um livro tão bem feito dessa série. 😂 Além da ilustração linda que acompanha a capa dura, ele tem fitilho e uma diagramação super confortável, que permite ler sem cansar. Claro, outro aspecto que colabora muito pra isso é o fato da narrativa ser bem infantojuvenil, o que torna a experiência de leitura bem tranquila e fluida.

Esse volume reúne três livros da série: Paixão Mortal, Fim de Semana Alucinante e Festa de Halloween. O primeiro tem um quê meio sobrenatural, o segundo me lembra algo meio “Eu Sei O Que Vocês Fizeram No Verão Passado” e o terceiro tem uma pitada de “E Não Sobrou Nenhum” (tá, forcei um pouco a barra aqui, mas eu queria um paralelo pros três HAHAHA).

Paixão Mortal foi a história de que menos gostei. Nela, acompanhamos a paixão à primeira vista de um ginasta do colégio Sunnyside, Cory, pela aluna nova, Anna. Acontece que, quando ele decide ligar para a casa da garota para convidá-la pra sair, quem atende o telefone diz que não existe nenhuma Anna lá, pois ela está morta. Eu, que morro de medo de histórias de fantasmas, inicialmente fiquei entusiasmada com esse plot. Mas ao longo da trama esse teor sobrenatural vai se perdendo e a história fica bastante cansativa, porque o autor repete à exaustão o quanto Cory está obcecado por Anna. Eu entendo que essa repetição de palavras e estruturas textuais é provavelmente proposital, de modo que facilite o entendimento de leitores muito jovens, mas pra mim acabou tornando a experiência irritante. Como ponto positivo temos a revelação no final, que é convincente o bastante.

Fim de Semana Alucinante já é bem mais divertido! Aqui acompanhamos a empreitada dos membros do Clube de Campo do colégio Sunnyside (sim, tudo é ambientado no mesmo lugar), que resolvem aproveitar a ausência do monitor do Clube para acamparem sozinhos naquela que é conhecida como Ilha do Medo. Eles estão empolgadíssimos para passar uma noite por lá, mas tudo muda quando uma das alunas, Della, se perde do grupo e é abordada por um homem estranho e violento. Ao se desvencilhar dele, Della o empurra para uma queda fatal, e o grupo precisa encarar o fato de que agora compartilham um segredo terrível que envolve sua morte. As coisas pioram quando eles retornam da ilha, pois começam a ser ameaçados por uma figura misteriosa que aparentemente sabe o que aconteceu por lá. Gostei bastante do senso de urgência que o autor causou ao longo da história, com um perigo iminente à espreita. O desenvolvimento da trama foi bem mais legal que Paixão Mortal mas, em contrapartida, o final foi um banho de água fria sem nenhum plot twist. Talvez eu tenha esperado demais da trama, especialmente por lembrar da minha ótima experiência com Bela Gentileza (da série Casa do Pesadelo, também infantojuvenil), que compartilha dessa vibe de alguém perigoso vigiando os protagonistas.

Por fim, temos o terceiro título, Festa de Halloween. Aqui temos um outro grupo de alunos do Sunnyside sendo convidado para a festa de uma garota misteriosa, Justine, na sua mansão na Rua do Medo. Justine convida apenas 9 pessoas para sua festa, e quando eles chegam lá a garota revela uma noite de surpresas e brincadeiras assustadoras. Com o passar das horas, porém, as coisas começam a sair de controle e um dos convidados aparece morto no meio da festa. Enquanto uns tentam buscar ajuda, outros permanecem na casa tentando descobrir a verdade sobre Justine, com foco para o casal Terry e Niki, de quem gostei bastante. Festa de Halloween foi minha história favorita; adoro essa vibe claustrofóbica e de gente maluca fazendo os outros de refém rs. Considero essa a trama que mais tentou se desenvolver, tanto no aprofundamento de alguns personagens quanto na motivação por trás de tudo que aconteceu. 🙂

Sendo bem honesta com vocês, não dá pra esperar que Rua do Medo seja super profundo e mega desenvolvido, pois além do seu público-alvo ser bem jovem, o livro não se propõe a ser uma obra-prima do terror. É uma obra divertida, despretensiosa e muito nostálgica, especialmente pra quem cresceu lendo as obras da série Goosebumps ou Rua do Medo (e, no meu caso, Casa do Pesadelo também). Acredito que se você encarar essa leitura tendo em mente todos os seus pontos fortes e fracos com clareza, você pode se divertir como eu me diverti. 👻

Título original: Fear Street
Série: Rua do Medo
Autor: R. L. Stine
Editora: Rocco
Número de páginas: 448
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Livro cedido em parceria com a editora.
Esse não é um publipost, e a resenha reflete minha opinião sincera sobre a obra.