Review: A Sociedade da Neve

Oi pessoal, tudo bem?

A Tragédia dos Andes, acontecida em 1972, é uma história que já foi recontada muitas vezes. Eu a conheci quando tinha cerca de 12 ou 13 anos, ao ler o livro Os Sobreviventes, de Piers Paul Read, no qual é narrada a trajetória do time de rugby uruguaio Old Christians Club, cujo avião cai na Cordilheira dos Andes e os sobreviventes da queda tentam permanecer vivos em condições extremas. Dos 45 passageiros, somente 16 foram resgatados com vida após 71 dias. Recentemente estreou na Netflix uma produção que traz uma nova perspectiva sobre essa história, baseada no livro de Pablo Vierci, e está concorrendo ao Oscar de melhor filme internacional: A Sociedade da Neve. Vamos conhecer?

Sinopse: Após um acidente de avião no coração dos Andes, os sobreviventes unem forças e contam uns com os outros na luta para voltarem para casa.

Devido à notoridade da história dos sobreviventes dos Andes, acredito que não preciso discorrer muito sobre o tema do filme: de forma resumida, ele conta toda a trajetória dos tripulantes do momento em que têm a oportunidade de ir ao Chile até o momento de seu resgate – e todos percalços entre esses dois pontos fatídicos. Na queda, muitos tripulantes morreram, e quem sobreviveu precisou lutar contra a fome e o frio extremo, até o ponto em que não havia mais nenhuma fonte de alimento a qual recorrer que não fossem os corpos de quem havia falecido. Esse é um dos aspectos mais tristes e desconfortáveis da história, mas foi também o pacto que permitiu com que todos pudessem viver. Contudo, a maneira como A Sociedade da Neve trata de sobrevivência é sublime, transformando esse filme em uma história sobre companheirismo e fé.

Diferente de outras adaptações dessa tragédia, que exploram a antropofagia com um viés sensacionalista pra atrair mais público e explorar uma vivência muito dolorosa pela qual os sobreviventes passaram, A Sociedade da Neve enfatiza todas as maneiras pelas quais o grupo se articula para vencer cada dia. As lideranças que atuam de diferentes formas, as presenças tranquilizadoras que são fundamentais para manter a estabilidade, os momentos de leveza emocional em meio ao caos e também a coragem pra fazer o que ninguém mais deseja fazer – como, por exemplo, aqueles que assumem a tarefa de cortar a carne dos mortos. Todos esses papéis ganham destaque ao longo da trama, mostrando ao espectador todas as dificuldades que o grupo enfrenta e também as formas que eles encontram de suportarem esses terrores: juntos.

Outro aspecto fundamental que é trabalhado pelo roteiro é a importância da fé. Mas não unicamente a fé cristã, que sim, era bastante importante para o grupo. O filme é muito conduzido pelo olhar de Numa, uma das últimas pessoas a aceitar se alimentar de carne humana, e cujos valores estavam fortemente atrelados a sua moral religiosa. Porém, o longa também evidencia como a fé pode ser ampla e desassociada de religiões ou entidades: em um diálogo poderoso e emocionante, que me levou às lágrimas, Arturo Nogueira diz que a fé dele está depositada nos companheiros que cuidam de suas feridas, nos que saem para caminhar em busca de salvação para o grupo, nos que partem a carne sem dizer a quem pertenceu. Essa fé que eles tinham uns nos outros (e a sensibilidade do filme para mostrar  esse companheirismo) foi fundamental para a sobrevivência do grupo.

Em termos técnicos, A Sociedade da Neve é impecável. O elenco é excelente, entregando atuações intensas e mostrando transformações físicas que revelam todas as provações vividas na montanha. O roteiro é angustiante e, mesmo contando uma história que muitos já sabem como se desenrolou, consegue trazer plot twists pra quem não lembra exatamente o nome de cada pessoa que sobreviveu, como era o meu caso. A fotografia é de cair o queixo, com um visual impressionante que mostra toda a beleza e a imponência dos Andes, causando ao mesmo tempo a sensação de admiração e desolação. É um filme que impacta do início ao fim.

A minha dica é: não percam tempo e assistam A Sociedade da Neve. Diferente dos filmes que vieram antes, essa adaptação não tem um viés predatório, desejando explorar a história dos sobreviventes para ganhar audiência, mas sim contar as transformações psicológicas que um grupo cheio de sonhos e esperanças passou ao viver uma experiência traumática e inexplicável, para a qual ninguém poderia estar preparado. Deem o play, vale a pena.

Título original: La Sociedad de la Nieve
Ano de lançamento: 2023
Direção: J.A. Bayona
Elenco: Enzo Vogrincic, Agustín Pardella, Matías Recalt, Esteban Bigliardi, Diego Vegezzi, Esteban Kukuriczka, Francisco Romero, Rafael Federman

Dica de Série: Tudo Bem Não Ser Normal

Oi gente, tudo bem?

O ano tá acabando, mas ainda dá tempo de assistir uma série legal, hein? Ou, mais especificamente, um dorama hihi. ❤ Hoje vim indicar pra vocês um que entrou pra lista de favoritos, Tudo Bem Não Ser Normal.

Sinopse: Um caminho para a cura emocional se abre para uma escritora de livros infantis e para um cuidador de sala de psiquiátrica quando seus caminhos se cruzam.

Ko Mun-young é uma autora de livros infantis de renome, mas sua personalidade agressiva e antissocial faz dela uma pessoa super difícil de lidar (basicamente, só o dono da editora que a publica consegue essa façanha). Quando ela encontra o cuidador Moon Gang-tae em uma sessão de autógrafos de um de seus livros em uma situação inesperada – ele a impede de agredir um paciente psiquiátrico perigoso com uma faca -, o mundo dos dois colide e nunca mais volta ao normal. Gang-tae tem seus motivos para querer se manter longe dela: seu fardo já é muito pesado por cuidar sozinho do irmão mais velho, Moon Sang-tae, um rapaz que se encontra no Transtorno do Espectro Autista. Lidar com os rompantes de humor de uma autora temperamental definitivamente não está em seus planos. Além disso, os irmãos guardam seus próprios traumas em segredo, e essa solidão esmagadora faz com que Gang-tae se isole do mundo. Porém, Ko Mun-young é uma mulher teimosa e obstinada (pra não dizer mimada rs) e não está disposta a desistir do seu objetivo.

Preciso começar esse review com sinceridade: de início, achei muito difícil de torcer pelo casal principal e me envolver com a proposta de romance que o dorama sugeria. O motivo? A Ko Mun-young começa a série sendo extremamente tóxica. Ela é uma stalker obcecada, possessiva e manipuladora, e se as ações dela fossem cometidas por um homem, qualquer pessoa sensata ligaria pra polícia. Essa sensação me incomodou muito e me afastou demais da personagem, que tem uma personalidade difícil e fria, demorando muito a se expor e a demonstrar qualquer outra faceta que não a de uma mulher que olha apenas para seus próprios interesses. Contudo, doramas tendem a ser longos, e isso dá margem pra que os personagens ganhem desenvolvimento – o que ocorre aqui. Com o passar dos longos episódios, a protagonista vai tendo outros aspectos de si apresentados ao espectador. Ko Mun-young é fruto de uma família desequilibrada e tóxica, criada por uma mãe narcisista que deixou profundas marcas nela. Sua forma de lidar com as outras pessoas revela uma fragilidade imensa e um medo paralisante de perder as pessoas que a cercam. Seus traumas são profundos e ela nem consegue reconhecê-los, de tão grossa que é a casca que ela precisou criar para sobreviver. A proximidade com os irmãos Moon, aos poucos, vai criando rachaduras nessa casca, e o que mais gostei foi ver a transformação que ela passa não somente por se abrir para o amor verdadeiro com Gang-tae, mas pelo senso de família e de fraternidade que Sang-tae também oferece.

Contudo, apesar de ser uma história de amor, o grande destaque de Tudo Bem Não Ser Normal pra mim é a relação entre os irmãos Moon. O Transtorno do Espectro Autista é trabalhado com muita sensibilidade na figura de Sang-tae, mas o dorama também explora as dificuldades que Gang-tae enfrenta por ter que cuidar do irmão neurodivergente. Ele é um rapaz que precisou amadurecer muito cedo e abraçar responsabilidades que não eram condizentes com a sua idade, e como consequência ele não se permite viver experiências que sejam prazerosas ou focadas em si mesmo. Seu senso de abnegação é tão grande que é quase um atentado à sua própria autopreservação. Em contrapartida, Sang-tae não é retratado como uma pessoa neurodivergente perfeita e angelical, colocada em um pedestal de pureza apenas por enfrentar desafios. O personagem tem virtudes e defeitos, que são explorados ao longo do dorama, e tem uma construção maravilhosa em torno de seus próprios desejos, medos e desafios. É emocionante e intenso ver como a trama gira em torno da relação entre os irmãos, com suas dores e delícias, revelando como eles fariam de tudo um pelo outro ao mesmo tempo em que também são aqueles que mais podem se magoar.

O pano de fundo da história é o hospital psiquiátrico no qual Gang-tae trabalha, então existem muitos pacientes lá cujas histórias são contadas. Isso traz muita emoção ao dorama, além de carisma e também apego emocional para quem está assistindo. Você se afeiçoa aos personagens secundários e torce pra que eles encontrem a cura de seus traumas, para que eles consigam lidar com seus fantasmas ou apenas consigam encontrar uma forma de conviver com sua forma de existir no mundo. Para além dos dramas dos personagens, o dorama também carrega um tom de mistério muito envolvente: o passado de Ko Mun-young é repleto de pontas soltas, e existe um aspecto sombrio na história que é muito bem trabalhado. Foi o primeiro dorama que assisti com um típico vilão e foi muito interessante ver esse papel se desdobrando e movendo as peças do jogo.

Recomendo Tudo Bem Não Ser Normal pra todo mundo que busca uma série que emociona, com a construção de relações fortes entre os personagens e que aprofunde seus dramas com competência. Poucas séries que vi recentemente me emocionaram tanto quanto essa, e muito disso vem da entrega do elenco principal em cada cena que exigia a demonstração da dor e da intensidade dos sentimentos de cada personagem. A cada episódio eu torcia pra que o processo de cura deles evoluísse mais um passo, e a cada episódio eu percebia como os laços que eles firmavam uns com os outros era fundamental pra fechar as feridas e formar as cicatrizes necessárias. É um dorama inspirador, visualmente impecável e com lições incríveis sobre como somos muito mais do que nossos traumas. Vale a pena dar uma chance! ❤

Título original: It’s Okay to Not Be Okay
Ano de lançamento: 2020
Direção: Park Shin Woo
Elenco: Kim Soo-hyun, Seo Ye-Ji, Oh Jung-se, Park Gyuyoung, Kim Joo-hun, Park Jin-joo, Kang Ki-doong, Jang Young-Nam

Dica de Série: Sorriso Real

Oi pessoal, tudo bem?

Sim, a era dos doramas segue firme e forte por aqui, e eu tenho mais um super fofo pra indicar pra vocês: Sorriso Real, disponível na Netflix!

Sinopse: Em meio a uma disputa pela herança, um charmoso herdeiro de uma rede de hotéis se apaixona por uma mulher carismática e seu enorme sorriso.

Sorriso Real conta a história de um casal improvável, mas que me conquistou profundamente pela maturidade com que lidam com seu relacionamento ao longo dos episódios depois que a coisa engrena. Sa-rang é uma moça dedicada e apaixonada por hotelaria e turismo, que sempre estudou muito e trabalhou duro pra ser concierge. Ela consegue uma oportunidade no Hotel King – o mais prestigiado da Coreia do Sul – mesmo sem ter formação universitária graças às suas habilidades diversificadas mas também ao seu belo e cativante sorriso, porque uma das características da rede é justamente essa: o sorriso sempre radiante para atender bem aos hóspedes. Já Gu Won é um dos herdeiros da rede, um rapaz brilhante mas pouco interessado no negócio da família e que tem um profundo asco por sorrisos falsos. Essa premissa do Hotel King faz com que ele antipatize de Sa-rang num primeiro momento, mas logo ele entende que essa antipatia está se transformando em outra coisa, e o gelo no seu coração está sendo derretido pelo sorriso da moça. Gu Won tem um relacionamento conturbado com a família, mas aos poucos – graças à proximidade com Sa-rang – ele começa a se interessar pelas atividades do Hotel King e também pelo bem-estar dos funcionários, diferente do viés ganancioso de sua meia-irmã, que gere o hotel.

Essa é só a pontinha do iceberg de Sorriso Real, o pretexto pelo qual os protagonistas se aproximam, mas nem de longe é a única razão pela qual gostei tanto desse dorama. Vamos começar falando de Sa-rang: ela é o tipo de protagonista que inspira você a ser alguém melhor. Apesar de sua positividade, ela não é uma pessoa tóxica que só vê o lado bom da vida. Ela mostra para as amigas e mesmo para Gu Won suas frustrações quando lhe é permitido parar de sorrir. Mas, mesmo assim, sempre que possível optar por uma visão otimista, ela procura inspirar um comportamento assim e proporcionar bons momentos a quem está ao redor dela. Eu sou uma pessoa mais pessimista e fiquei muito inspirada pelo jeitinho Sa-rang de ser. ❤ Além disso, ela é uma personagem batalhadora, que não se intimida pelas adversidades que a vida impõe. Isso não torna o caminho dela mais fácil: a série mostra que foram necessários anos de estudo e dedicação para que ela atingisse o nível de conhecimento e excelência que ela possui como concierge, mesmo sem ter acesso financeiro a uma universidade de ponta como seus colegas, mas ela fez tudo que estava ao seu alcance para ter um repertório cultural vasto, aprender diversos idiomas e ter uma postura impecável para ser reconhecida como o melhor talento do Hotel King. Por fim, como par romântico, ela também promove conversas maduras com Gu Won, o que é um acalento para alguém como eu, que está cansada de ver séries de TV americanas mostrando adultos se comportando como adolescentes.

Gu Won também é um mocinho cativante! Ele é o “fall first” da relação e o dono do meu coração todinho. É fofo demais como ele tenta conquistar Sa-rang incansavelmente. E assim, ele é um pouco insistente e isso pode ser visto de uma forma meio “cara, você é chefe dela, tá forçando a barra”, mas eu consegui relevar como um estereótipo (fica a seu critério, tá?). Enfim, pra mim o Gu Won é uma green flag total e eu me apaixonei completamente por ele. Os dois são um casal que sabem conversar, que são vulneráveis juntos e que melhoram um ao outro, respeitando seus sonhos e impulsionando um ao outro sempre a alçar voos maiores e mais altos. Tudo que ele faz pela Sa-rang me faz suspirar, sinceramente. ❤ Fora que ele é lindo, mas enfim, nem vou entrar nesse mérito HAHAHAHAHA! Além disso, eu também admiro profundamente a ética profissional do protagonista masculino, que defende a equipe e os funcionários do Hotel King e da Terra King (a equipe “de elite”, sob sua responsabilidade) com unhas e dentes, lutando por mais dignidade e condições justas de trabalho para todos. Gu Won também protagoniza um dos núcleos dramáticos do dorama por estar no centro de uma família disfuncional: sua meia-irmã compete com ele por poder e o sabota sempre que possível, o que dá também uma carga de reviravoltas bem interessante para a história. Porém, apesar disso, ele surpreendentemente protagoniza algumas das cenas mais engraçadas da série – mesmo sendo avesso a sorrisos. Suas cenas com seu leal assistente, o atrapalhado Sang-sik, me faziam gargalhar!

Já que mencionei Sang-sik, vale dizer que os personagens secundários de Sorriso Real são ótimos e possuem histórias próprias. As melhores amigas de Sa-rang são o ponto de destaque pra mim, sendo simplesmente exemplos maravilhosos de amizade feminina. Elas não competem entre si, sendo uma segunda família umas para as outras e se apoiando em todas as circunstâncias. Da-eul e Pyung-hwa não apenas giram em torno do plot de Sa-rang, mas também são mostradas vivendo seus desafios pessoais no trabalho e em suas vidas particulares, o que é muito bacana porque nos faz sentir mais conexão e afinidade com elas. Quando as três estão juntas – desabafando, bebendo, cantando e dançando – a gente quer fazer parte do grupo instantaneamente. ❤

Sorriso Real é um dorama perfeito pra quem quer passar o tempo sentindo o coração derreter  e se encantar por um casal que não poderia ser mais diferente, mas que se completa perfeitamente. ❤ Com ótimos personagens, cenas engraçadas e muito romance (sério gente, esse dorama SERVE cenas cheinhas de fanservice que deixam a gente com borboletas no estômago), essa foi uma série que me conquistou de cara e que deixou saudades. Espero que você se apaixone também!

Título original: King the Land
Ano de lançamento: 2023
Criação: Lim Hyun-ook, Chun Sung-il, Choi Rome
Elenco: Lee Jun-Ho, Im Yoon-ah, Go Won-Hee, Kim Ga-eun, Se-ha Ahn, Sun-young Kim, Kim Jae-Won

Dica de Série: Uma Advogada Extraordinária

Oi galera, tudo bem?

Chegou a hora de dividir com vocês a coisa mais legal que aconteceu recentemente a nível de entretenimento por aqui: minha nova personalidade dorameira. 🫰 SIM, esse momento chegou! E ele foi possível graças a Uma Advogada Extraordinária, um dorama maravilhoso que assisti na Netflix e que arrebatou meu coração. Vamos conhecer?

Sinopse: Recém-contratada por um grande escritório de advocacia, uma jovem brilhante no espectro autista enfrenta desafios dentro e fora do tribunal.

Woo Young-woo (não importa a a ordem que for lido rs) é uma advogada brilhante, se formou como a mais inteligente da sua turma, mas que ainda não conseguiu oportunidades de emprego por enfrentar preconceitos devido ao seu diagnóstico de TEA – Transtorno do Espectro Austista. Porém, ao conseguir uma vaga em um dos escritórios mais importantes da Coreia do Sul, o Hanbada Advocacia, a jovem advogada tem a oportunidade de colocar seu talento à prova, mas também desenvolver seu contato humano e aprender que além da paixão pela lei, ela também precisa aprimorar sua sensibilidade para lidar com os clientes e com as sutilezas de cada caso.

Se você já assistiu Atypical (outra série maravilhosa da Netflix que eu recomendo muito), é bem possível que você goste de Uma Advogada Extraordinária. Park Eun-bin também entrega uma atuação delicada, com algumas características do espectro mais acentuadas, e me chamou a atenção a coincidência de que sua personagem também tenha um encanto muito especial por um animal marinho: no caso de Woo Young-woo, baleias, enquanto Sam era aficcionado por pinguins. Meu carinho por Atypical e por Sam fez com que eu me afeiçoasse rapidamente por Woo Young-woo, mas logo a personagem se afastou dele e ganhou seu espaço próprio no meu coração por sua gentileza, sensibilidade e pureza.

Comentei há alguns posts que vivi um ano 2023 bem difícil, e justamente por isso eu estava em busca de entretenimento que pudesse me trazer conforto, leveza e uma sensação de que as coisas poderiam dar certo. Uma Advogada Extraordinária foi tudo que eu precisava, chegando no melhor momento possível e me trazendo os melhores sentimentos que eu poderia querer. Cada episódio é focado em um caso, o que por si só já é um formato que me atrai muito e me deixa super curiosa pra maratonar, fazendo com que os mais de 60 minutos de duração de cada episódio passem voando. Além disso, ver o amadurecimento pessoal de Woo Young-woo e sua relação com os colegas, bem como os desafios que ela precisa enfrentar como uma pessoa neurodivergente, também torna o dorama muito instigante. Ainda que o tom da série seja sempre otimista, Uma Advogada Extraordinária não nos poupa dos desafios diários da protagonista, nos expondo aos preconceitos e às dificuldades que ela vivencia somente por ser diferente. Por muitas vezes ela é diminuída e subestimada exclusivamente por seu diagnosticado de TEA, mesmo sendo uma advogada fantástica, e há muitas barreiras a serem vencidas tanto em sua vida profissional quanto pessoal.

Quando entramos nas relações amorosas da série, esses aspectos não são deixados de lado. Uma Advogada Extraordinária discute o tema do consentimento de forma bastante direta, e existem muitos paralelismos entre os casos que a Hanbada defende e a própria condição de Woo Young-woo. O grau do espectro da protagonista é leve, mas existem outras neurodivergências mais graves ao longo da série que colocam em debate questões como consentimento, atribuição de culpa e temas muito interessantes no que tangem a esfera de possíveis limitações intelectuais. A própria Woo Young-woo nunca teve um relacionamento amoroso e se apaixona pela primeira vez por seu colega de trabalho, também conhecido como o crush dos crushes e o maior good guy que a televisão já viu, Lee Jun-ho. Pela pouca experiência que tenho com os doramas que assisti, é um tanto óbvio o desenvolvimento do amor dos dois, especialmente pela forma como tudo se dá desde o primeiro episódio, com trocas de olhares significativas e trilha sonora romântica, mas ainda assim o desenvolvimento é super lento e gradual, o que quase ME MATOU DO CORAÇÃO e ao mesmo tempo me deixou cheia de borboletas no estômago. 😂 Me apaixonei perdidamente por eles e, ao mesmo tempo que fiquei ansiosa pra ver tudo se concretizando, também achei bacana como a série lentamente foi construindo um terreno seguro pra que alguém como Woo Young-woo pudesse se sentir confortável pra dar passos que ela nunca pensou em dar. E isso só foi possível porque existe alguém que a enxerga para além de sua neurodivergência, capaz de vê-la como um ser humano completo e fascinante. Porém, os desafios que eles enfrentam como casal – o preconceito e o estranhamento das outras pessoas – são bem tristes e revoltantes, principalmente pelo caráter realista dos comentários que eles recebem: é super possível imaginar isso acontecendo com as pessoas fora da ficção. 😥

Os personagens secundários de Uma Advogada Extraordinária são todos bem trabalhados. Os colegas da Hanbada têm tempo de tela, possuem personalidades distintas e motivações próprias (ainda que um dos antagonistas, Min-woo, tenha tido um desenvolvimento tosco e conveniente na reta final), o que torna interessante acompanhá-los e não deixa a série totalmente dependente de sua protagonista. Há espaço também para a família e amigos de Woo Young-woo, que contribuem com a “normalidade” de sua rotina, saindo daquele ~juridiquês todo do escritório. Em suma, é fácil torcer pelo belo “raio de sol” Su-yeon, se comover com a história do Dr. Jung ou ainda morrer de rir com os conselhos amorosos de Geu-ra-mi e do Min-shi no bar.

Por último, mas não menos importante, eu não poderia deixar de fora os elementos artísticos que me encantaram na atmosfera de Uma Advogada Extraordinária. Eu estava muito acostumada com as produções americanas, que de certa forma são bastante pausterizadas e há muito tempo não me ofereciam nada de muito inovador que não fosse o roteiro mesmo. Quando resolvi assistir dorama pela primeira vez, tudo foi motivo de estranhamento, mas não necessariamente de um jeito ruim. A forma de atuação, a trilha sonora, a identidade visual: fui impactada pelo estilo como um todo. E acredito que a delicadeza desse estilo, somada ao capricho visual e à trilha sonora repleta de músicas ao piano e belas paisagens, foi um dos principais pontos fortes que conseguiu me transportar pra esse mundo novo de uma forma muito imersiva.

Uma Advogada Extraordinária reuniu tudo que eu gosto em uma série, mas foi além: também trouxe aquilo que eu nem sabia que precisava. É uma história sobre uma profissional talentosa, resiliente, e sobre alguém que acredita em suas paixões e não está disposta a desistir dos seus sonhos por maiores que sejam os desafios impostos. Se essa mensagem não é encorajadora o suficiente, não sei qual seria. 😛 Além disso, o dorama está embalado em uma direção de arte de beleza ímpar, com um romance que inspira e encanta, e um rol de personagens que conquista e cativa. E aí, te convenci a dar uma chance? Espero que sim, porque vale a pena. ❤

Título original: Extraordinary Attorney Woo
Ano de lançamento: 2022
Direção: Yu In-sik
Elenco: Park Eun-bin, Kang Tae-oh, Kang Ki-young, Jeon Bae-soo, Ha Yoon-kyung, Joo Jong-hyuk, Joo Hyun-young, Im Sung-jae, Baek Ji-won, Jin Kyung

Dica de Série: Rainha Charlotte: Uma História Bridgerton

Oi pessoal, tudo bem?

Confesso que inicialmente não hypei no anúncio do spin-off Rainha Charlotte: Uma História Bridgerton (mesmo sendo fã da série Bridgerton), mas acabei dando uma chance pra série durante as férias e cá estou pra me redimir e indicar pra vocês essa produção que, sim, conseguiu trazer uma história mais profunda e madura do que o material de origem. ❤ Vamos conhecer?

Sinopse: Neste spin-off, o casamento da rainha Charlotte com o rei George é muito mais que uma história de amor: é uma transformação na alta sociedade do universo de Bridgerton.

A série tem como foco duas linhas do tempo: no passado, conhecemos a origem da rainha, como ela foi trazida para conhecer o rei George, o início de seu casamento, a doença do rei, a construção do amor deles, mas também todo o impacto que essa união teve na sociedade inglesa na época; no presente, acompanhamos Charlotte constantemente preocupada em saber se George morreu ou não, e também com o futuro da sua família, pois infelizmente a esposa de seu filho mais velho e seu neto faleceram, e agora não há um herdeiro legítimo ao trono e ela precisa que algum de seus filhos se case e gere uma criança. O impacto da linha do tempo presente provavelmente vai refletir na próxima temporada de Bridgerton, já que existem interações entre Lady Danbury e Violet Bridgerton também, mas o que realmente fisga o espectador é a timeline do passado, em que descobrimos como a sociedade chegou ao ponto que vimos lá na primeira temporada da série de origem, além de ser também a linha do tempo que nos revela a história de amor que – até então – só tinha sido levemente abordada, e o espectador tinha apenas pequenas peças que possibilitavam saber que Charlotte e George se amavam muito, mas sem conhecer a fundo seu passado.

Devo dizer que eu esperava uma série bastante romântica, justamente por saber que Charlotte viveu uma vida devotada a George. O modo como a doença dele foi apresentada em Bridgerton, e o cuidado que ela tem com a situação, mostra uma ternura que já indicava que ali existia um sentimento muito verdadeiro. Para a minha surpresa, Rainha Charlotte é uma série que foca muito pouco no romance. Nos três primeiros episódios, o casal protagonista mal se fala! Eles compartilham uma cena muito fofa quando se conhecem, aí logo se casam (pois Charlotte é trazida à Inglaterra já como uma noiva prometida ao rei) e brigam logo após a cerimônia, quando George se recusa a dormir com ela e morar na Casa Buckingham. Charlotte passa dias e dias a fio solitária, sentindo-se abandonada e com a sensação de que falhou como esposa, arrependida de ter se casado e com uma sensação de amargura muito profunda. Posteriormente, a série nos apresenta os primeiros episódios pelo ponto de vista de George, e é nesse momento que o espectador tem seu coração partido em mil pedacinhos: finalmente entendemos o motivo pelo qual ele tomou tais decisões e o que George realmente esteve fazendo enquanto se manteve distante da rainha. Ainda assim, isso não muda o fato de que, ao longo dos 6 episódios, a maior parte do tempo os dois passam separados. Tanto que eu demorei bastante a acreditar que Charlotte já estivesse apaixonada por George, mesmo sabendo que a recíproca fosse verdadeira; foi apenas no fim da temporada que senti de verdade esse amor acontecendo, e quando ele veio, ele veio arrebatador. O último episódio de Rainha Charlotte – em especial, a última cena – é de arrepiar, e eu chorei de soluçar. É linda, sensível, cheia de referências a coisas importantes na história do casal e dá uma sensação agridoce muito marcante. É um final primoroso, e ao mesmo tempo em que parte o nosso coração, ele também nos dá um pouquinho de esperança, revelando um lampejo da sanidade de George e o profundo amor que os conecta desde a juventude.

Uma surpresa de Rainha Charlotte diz respeito à doença do rei, que esteve presente ao longo de todo o relacionamento dos dois. De certo modo, esperei por um romance arrebatador que, talvez no final, fosse ser atrapalhado pela descoberta dos sintomas, o que não ocorreu. Isso traz um peso emocional muito mais intenso do que as temporadas prévias de Bridgerton (por exemplo) haviam apresentado, e Charlotte e George lidam com uma pressão em seu relacionamento que vai muito além do peso da responsabilidade de governarem a Grã-Bretanha. O fato deles serem tão jovens e já serem marcados por esse desafio torna tudo ainda mais difícil, porque o espectador descobre que a vida do casal foi marcada por um obstáculo instransponível. Por outro lado, saber que George encontrou uma parceira capaz de amá-lo sob todas as circunstâncias, e de aceitar todas as suas facetas, também é acalentador. Além disso, esse plot mexe muito com quem assiste por mostrar a terrível face dos tratamentos psiquiátricos da época, que eram baseados na mais pura tortura. A barbárie que George enfrenta é revoltante, e saber que muito disso foi perpetrado durante séculos é de embrulhar o estômago. Pessoas que tinham condições mentais ainda mais instáveis, incapazes de se defender, sofreram muito mais nas mãos de médicos que faziam os piores experimentos em nome de “curar a mente”, e ver isso refletido na série é bastante impactante.

Mas se eu disse que Rainha Charlotte foca pouco no romance (pelo fato de Charlotte e George passarem bastante tempo afastados ou brigados), no que ela foca? Na minha opinião, no impacto social que ter uma rainha negra causou na sociedade inglesa no universo fictício de Bridgerton. Charlotte faz amizade com a jovem Lady Danbury, que ganha o título graças à mãe de George, a princesa-viúva Augusta. Esse título é fornecido ao marido de Agatha Danbury pra mostrar ao Parlamento que o intuito de casar George com uma mulher de pele escura foi intencional – o que eles chamam de Grande Experimento. O “escurecimento” da corte é um movimento político que Augusta faz pra que não haja dúvidas de que tudo foi planejado previamente (o que não é verdade, pois ela imaginava que a pele de Charlotte fosse mais clara). Ainda assim, uma vez que se torna Lady Danbury, Agatha usufrui desse título com muita sabedoria, negociando seus direitos com Augusta em troca de informações e garantindo que aquilo que é fornecido aos lordes brancos também seja fornecido ao seu marido e à sua família. O plot de Lady Danbury é extremamente interessante: ela odeia o marido, que pratica estupro marital constantemente, mas quando ele morre (afinal, é um idoso) ela se vê bastante perdida com a total liberdade que passa a ter, considerando que foi prometida a ele aos 3 anos de idade e toda a sua vida girou em torno dele e de seus gostos pessoais. Agatha é uma mulher que precisa reaprender sobre si mesma e entender o que é ter seu próprio espaço no mundo, além de lutar com unhas e dentes pra não perder seus privilégios e garantir os seus direitos. Sua amizade com Charlotte também é muito bacana, porque ela consegue conscientizar a rainha da importância que ela tem ao servir de exemplo para a corte e para a sociedade como a primeira mulher negra em sua posição. Adorei acompanhar sua evolução e sua história de origem e terminei a série admirando-a ainda mais como personagem.

Além de tudo, é claro que Rainha Charlotte mantém o mesmo nível de excelência de Bridgerton no que diz respeito à trilha sonora e belos figurinos. Há também representatividade LGBTQIA+ por meio de Brimsley, o leal braço direito de Charlotte, e Reynolds, também leal valete de George. Em relação às cenas de sexo, achei menos calientes quando comparadas às da série original. Quem assistiu, o que achou? 👀

Em resumo, quebrando várias das minhas expectativas, Rainha Charlotte: Uma História Bridgerton me surpreendeu demais, de uma forma totalmente positiva. Eu esperava uma coisa e encontrei outra, muito mais profunda, bem trabalhada e complexa. Amei isso! A série trata de saúde mental, de mudanças sociais, de racismo, de um amor que é construído com o tempo e que também perdura com o tempo. É uma história sobre aceitar quem amamos em todas as suas facetas, mesmo aquelas que a própria pessoa não aceita e das quais ela quer fugir. É uma história inspiradora e muito bonita, que me emocionou muito mais do que pensei que poderia quando dei um “play” tão despretensioso. Se tornou minha temporada favorita no universo Bridgerton! ❤ Recomendadíssima!

Título original: Queen Charlotte: A Bridgerton Story
Ano de lançamento: 2023
Direção: Tom Verica
Elenco: India Amarteifio, Corey Mylchreest, Arsema Thomas, Golda Rosheuvel, Adjoa Andoh, Michelle Fairley, Ruth Gemmell, Sam Clemmett, Freddie Dennis, Hugh Sachs

Review: Glass Onion: Um Mistério Knives Out

Oi pessoal, tudo bem?

Eu não perco a chance de assistir ou ler uma história de mistério/investigação policial, mas apesar das críticas positivas, o primeiro filme Knives Out (Entre Facas e Segredos, aqui no Brasil) não me ganhou, e eu fiz um review bem decepcionado aqui no blog. Contudo, as ótimas críticas da continuação, Glass Onion, acabaram me deixando curiosa, e cá estou pra contar pra vocês se valeu a pena dar uma segunda chance. Bora de resenha? 😉

Sinopse: O ricaço Miles Bron convida seus amigos excêntricos para sua ilha para jogar um jogo de detetive. Mas um assassinato real é cometido e as coisas saem do controle. Todos são suspeitos e a morte pode vir de onde se menos imagina.

A sinopse é curta, direta e eficiente, então não vou me estender muito além dela pra resumir a trama. O adendo que farei é que, além dos amigos de Miles, quem também recebe um convite para a ilha é o detetive Benoit Blanc. Quando ele chega ao local, o próprio Miles fica surpreso, pois não foi ele quem enviou o convite a Benoit. Porém, a presença do detetive se torna mais um elemento para “abrilhantar” o jogo maluco de Miles, cujo ego supera qualquer estranheza com o fato de que alguém enviou um convite sem seu consentimento. Para completar o panorama geral, uma das convidadas – Cassandra “Andi” Brand – é a ex-sócia de Miles, e foi muito prejudicada ao ser expulsa da empresa que ela idealizou e que fez de Miles milionário, o que deixa o clima da confraternização super tenso.

Podemos definir o cenário de Glass Onion como uma torta de climão. O espectador não demora a perceber que a amizade entre os personagens é frágil como um castelo de cartas, pronta a ruir ao menor sopro. O dinheiro de Miles parece comprar muito mais do que bens materiais, e ao longo do filme isso vai sendo mostrado aos poucos: cada personagem deve algum tipo de lealdade a ele, e isso é fundamental para o cerne do crime que ocorre lá pela metade do filme. Miles convida seus antigos amigos para esse jogo de detetive que ele idealizou, mas demora um certo tempo até que um assassinato de verdade aconteça. Porém, para a minha surpresa, não achei que o filme se tornou lento ou entediante até que isso ocorresse (diferente do seu antecessor, que mesmo tendo um assassinato de cara me fez querer dormir o longa inteiro). O ritmo de Glass Onion é muito bom, e ele intercala a comédia de uma forma bem mais competente e interessante do que o primeiro Entre Facas e Segredos. Deixo também o mérito pra atuação de Edward Norton, que entrega bem esse tipo de papel – conseguindo ser ao mesmo tempo mesquinho, engraçado de modo constrangedor e profundamente irritante, tal qual esses milionários sem noção.

Glass Onion é um filme que satiriza diversos tipos sociais, então temos uma socialite envolvida em escândalos trabalhistas com sua fábrica de roupas, uma política que conta com o dinheiro sujo do amigo na sua campanha, um homem extremamente machista que faz vídeos pro Youtube, entre outros estereótipos que, quando colocados juntos, transformam o ambiente numa panela de pressão prestes a explodir. Benoit é o ponto de equilíbrio, aquele observador externo que vai juntando as pontas soltas pra descobrir o verdadeiro culpado pelo assassinato que ocorre na ilha, mas também por outro mistério – sobre o qual não vou falar pra não estragar uma das melhores partes do filme. Mas é um plot bem interessante e que é a verdadeira graça da história. Inclusive, preciso destacar a atuação de Janelle Monáe como Andi, que é o grande destaque do longa. Ela consegue entregar nuances super diferentes na sua interpretação (que vão da inocência ao rancor), além de protagonizar as melhores cenas do filme com uma energia hipnotizante.

Em resumo, adorei Glass Onion e fiquei contente por decidir dar uma nova chance a essa franquia (já podemos chamar assim?). Com o sucesso, é possível que venham mais filmes, e agora estou definitivamente mais empolgada para conferir os próximos. Glass Onion: Um Mistério Knives Out é uma ótima história de detetive com humor na medida certa, um final surreal divertidíssimo e plot twists que mantêm o espectador ligado o tempo todo. Recomendo!

Título original: Glass Onion: A Knives Out Mystery
Ano de lançamento: 2022
Direção: Rian Johnson
Elenco: Daniel Craig, Edward Norton, Janelle Monáe, Kathryn Hahn, Leslie Odom Jr., Kate Hudson, Dave Bautista, Jessica Henwick, Madelyn Cline, Noah Segan

Review: Na Sua Casa ou Na Minha?

Oi gente, tudo bem?

Não é à toa que Na Sua Casa ou Na Minha? ficou no Top 10 Filmes da Netflix por vários dias: que comédia romântica gostosa, gente! ❤ Se você também tava com saudade de um filme que realmente suprisse essa categoria, continue lendo porque essa dica vale a pena.

Sinopse: Grandes amigos e totalmente opostos, Debbie e Peter trocam de casa por uma semana. Será que essa experiência vai abrir as portas para o amor?

Eu costumo dar meu voto de confiança ao que é produzido pela Reese Whiterspoon porque adoro muitas das séries e filmes dela, então isso somado ao buzz em torno do seu novo longa me fizeram dar o play com bastante empolgação em Na Sua Casa ou na Minha?. O filme nos apresenta a Debbie e Peter, dois melhores amigos que se conhecem desde os 20 e poucos anos, quando dormiram juntos, mas cujo relacionamento não evoluiu para a esfera amorosa e se transformou em uma amizade sólida e duradoura. Isso já me surpreendeu, porque o título e o pôster me induziram a pensar que o longa seria algo mais relacionado ao clichê de friends with benefits. Debbie é divorciada, mora em Los Angeles com o filho (Jack) e abandonou o sonho de ser uma editora literária pra focar em uma carreira como contadora – uma opção mais segura e estável para manter sua família. Peter mora em Nova York e nunca alcançou o antigo sonho de ser escritor, trabalhando como um bem-sucedido profissional de branding. Quando Debbie precisa fazer um curso em NY mas não tem ninguém com quem deixar Jack, Peter se oferece pra passar a semana na casa dela como babá, oferecendo seu apartamento no Brooklyn pra Debbie se hospedar. A semana na qual eles trocam de casas vira a rotina dos dois de cabeça pra baixo, e eles passam a descobrir detalhes sobre o outro que nem 20 anos de amizade foram capazes de desvendar.

Na Sua Casa ou Na Minha? conseguiu a façanha de fazer com que os dois plots fossem cativantes, na minha opinião. Eu adorei ver Ashton Kutcher no papel de novo “parceiro no crime” de Jack, tentando se aproximar do garoto, dando conselhos pra ele se enturmar na escola (com conselhos bem ruins, admito) e levando ele pro mau caminho alimentar. 😂 Peter é um personagem que a princípio parece raso – é o estereótipo de bonitão que nunca namora alguém por muito tempo –, mas durante sua estada na casa de Debbie vamos entendendo o porquê dele manter essa “fachada”. É nítido o ciúme que ele sente do vizinho de sua amiga, especialmente quando ele descobre que existe uma amizade colorida rolando ali (afinal, Debbie não tá morta, né?). O espectador percebe sem demora que Peter é apaixonado por Debbie, mas não fica claro o motivo pelo qual esse sentimento nunca veio à tona e porque ele nunca tentou nada com ela ao longo de duas décadas, especialmente quando lembramos que o primeiro encontro deles foi sexual. Por que ele deu um ghosting na Debbie pra não terem mais nenhum date e depois se tornou amigo dela? O filme explica isso, mas leva um tempinho. Aliás, aproveitando esse gancho, eis uma das críticas negativas que tenho em relação à produção: sua duração é mais longa do que precisava ser.

Retornando à história… Em Nova York, Debbie se depara com a vida de luxo do amigo, completamente diferente da sua. Só que, apesar do dinheiro, Peter vive uma vida solitária – seu apartamento não tem um toque pessoal, uma decoração, um aconchego, nada. Os copos têm até etiqueta de preço! Debbie acaba fazendo amizade com a vizinha de Peter (e ex-peguete dele), Minka, que é uma personagem com intuito de ser um alívio cômico pra história. Eu acho ela um pouco forçada (quem é que fica tão bff de alguém assim tão rápido, gente?), mas sua índole é boa e ela tenta dar empurrõezinhos bem-vindos em Debbie, então dá pra relevar. Também é bacana a vibe “girls taking New York” das duas. 😂 Durante sua semana na cidade, Debbie conhece e se relaciona brevemente com um editor famoso, o que a possibilita entrar em contato com o mundo literário, que sempre foi seu grande sonho; porém, assim como Peter, Debbie também precisa enfrentar seus verdadeiros sentimentos e tomar decisões importantes se quiser ser verdadeiramente feliz e honesta consigo mesma.

É muito bacana assistir uma comédia romântica com personagens mais velhos e com preocupações relacionadas a coisas além do amor, como a carreira, por exemplo. Tanto Debbie quanto Peter deixaram sonhos pra trás devido às obrigações da vida e às necessidades que surgiram, mas ao mesmo tempo o longa também traz a esperança de que nunca é tarde pra recomeçar: seja vivendo seu grande amor ou recalculando a rota da sua profissão. Eu tô chegando nos 30, gente, então esse tipo de história ressoa forte por aqui. 😂 Gosto de ser impactada por tramas que mostrem que nossos sonhos podem ser realizados em diversos momentos da vida, e que não temos só a casa dos 20 pra realizarmos todas as nossas conquistas pessoais, como muitas das produções hollywoodianas tentam vender.

Na Sua Casa ou Na Minha? é um filme que entrega uma dupla de protagonistas carismáticos, pelos quais a gente torce individualmente e também shippa muito como casal. Além disso, a história de ambos é envolvente em cada uma das cidades, e o filme consegue construir um romance mesmo com os personagens a km de distância e mal interagindo um com o outro. A trama faz com que o espectador acredite na história da amizade deles e, consequentemente, no amor que sempre esteve ali. Então se você procura uma boa comédia romântica e um casal de quem gostar, esse filme é a escolha certa. ❤

Título original: Your Place or Mine
Ano de lançamento: 2023
Direção: Aline Brosh McKenna
Elenco: Reese Witherspoon, Ashton Kutcher, Zoe Chao, Jesse Williams, Wesley Kimmel, Tig Notaro, Steve Zahn

Dica de Série: Wandinha

Oi gente, tudo bem?

Ainda dá tempo de falar sobre a série que se tornou febre no TikTok? Espero que sim, porque eu amei Wandinha e não poderia deixar de indicar por aqui. 🤭

Sinopse: Inteligente, sarcástica e apática, Wandinha Addams pode estar meio morta por dentro, mas na Escola Nunca Mais ela vai fazer amigos, inimigos e investigar assassinatos.

Após um… digamos… “incidente” na escola que Wandinha frequentava (também conhecido como defender seu irmão de bullies usando piranhas enquanto eles treinavam na piscina), a jovem Addams é transferida pra uma escola especial, na qual seus pais também estudaram: a Nevermore Academy. Ela é conhecida por ser um internato para quem tem habilidades e características especiais, então por lá existem lobisomens, vampiros, sereias e outras pessoas excluídas da sociedade que possuem dons. A escola fica ao lado de uma cidade minúscula, Jericho, cuja economia até gira em torno do internato, mas tem um histórico não superado de ódio aos excluídos. Quando mortes estranhas começam a acontecer e todos passam a desconfiar dos alunos da Nevermore, Wandinha decide investigar por conta própria, dando início a uma trama muito maior do que ela – e com consequências letais.

É impossível falar desse fenômeno da Netflix sem mencionar a atuação de Jenna Ortega, que entregou uma Wandinha maravilhosamente ácida e cativante, mesmo que cheia de defeitos. A arrogância é um deles, por exemplo. 😂 Pra completar, ela tem uma postura totalmente fechada a novos amigos e relações. Por outro lado, Wandinha é inteligente, destemida e obstinada, além de engraçada justamente pelo seu modo seco, apático e cínico de ver a vida. Os comentários dela envolvendo morte e outras coisas obscuras são divertidos e rapidamente você se afeiçoa ao jeito turrão da personagem. O grande mérito por trás disso reside na atuação entregue e dedicada de Jenna Ortega, que se empenhou a criar vários “detalhes” na personagem (como o fato de atuar sem piscar). 

As amizades que a série constrói também são um ponto forte. Wandinha e Mãozinha, sua fiel escudeira, bolam planos juntas e Mãozinha está sempre ali para o que a protagonista precisa: seja entrar num cômodo trancado e desligar as câmeras, seja para amolecer um pouco o coração de gelo da garota. Como pode a gente torcer tanto pra uma mão, né? 😂 A outra amizade que surge na vida de Wandinha é Enid, sua colega de quarto e exato oposto em todos os sentidos possíveis. Eu adoro os paralelos de como tudo que cerca Enid é colorido, vibrante e otimista, enquanto o universo de Wandinha é preto, branco e cinza. Enid tem que insistir nessa amizade e por um bom tempo se doa mais do que Wandinha, mas é também com essa persistência que Enid consegue transformar o coração da amiga de uma forma significativa e bonita.

O único ponto que não gostei é o triângulo amoroso da primeira temporada, envolvendo um “normie” de Jericho e um aluno da Nevermore. Enquanto o primeiro, Tyler, vai conquistando Wandinha aos poucos por mostrar que, independentemente dela ser diferente, ela merece seu afeto, o segundo, Xavier, tem uma aura de mistério e uma química com a garota que fica clara desde o início da série. Os dois acabam envolvidos na investigação de Wandinha, que descobre que há um monstro à solta causando as mortes, e são muito importantes para todo o desenrolar da trama. Não posso falar muito sobre nenhum deles pra não soltar spoilers, mas posso dizer que são nomes que vão estar presentes de forma significativa em toda a investigação – e na conclusão dela.

Adorei o plot investigativo, porque naturalmente tenho afinidade com esse tipo de história. O fato de Wandinha não ser só uma série adolescente sobre romance, os poderes de clarividência da protagonista ou sua adaptação à escola nova me agradou muito, porque deu um senso de propósito à história e ótimos ganchos. A cada nova descoberta que Wandinha faz sobre o monstro e os mistérios envolvendo Jericho e Nevermore, você fica com mais e mais vontade de continuar dando play. Gostei bastante do desfecho da história e acho que amarrou bem as pontas soltas, deixando um caminho de possibilidades para uma segunda temporada, mas sem depender exclusivamente dela (ainda bem que a confirmação da renovação já chegou!).

Independentemente da coreografia que tomou conta do TikTok, Wandinha é uma série divertida e envolvente por si só. O clima macabro, o humor ácido e a investigação são pontos fortes que tornam a produção um entretenimento de qualidade, daqueles que divertem e fazem você nem ver o tempo passar, mesmo com episódios mais longos. Vale o hype e vale o play! 📺

Título original: Wednesday
Ano de lançamento: 2022
Criação: Alfred Gough, Miles Millar
Elenco: Jenna Ortega, Emma Myers, Hunter Doohan, Percy Hynes White, Joy Sunday, Georgie Farmer, Christina Ricci, Victor Dorobantu, Gwendoline Christie, Riki Lindhome

Review: Uma Garota de Muita Sorte

Oi pessoal, tudo bem?

Assisti há algumas semanas Uma Garota de Muita Sorte, mas outros conteúdos ganharam prioridade e só agora consegui trazer minha opinião a respeito. Vamos conhecer?

Sinopse: A vida perfeita de uma escritora começa se despedaçar quando um documentário sobre crimes reais faz com que ela confronte seu angustiante passado no colégio.

No longa, estrelado pela carismática Mila Kunis, conhecemos Ani, uma mulher com a vida dos sonhos: ela tem um emprego bacana como escritora numa revista, é noiva de um homem charmoso e rico e tem aquele corpo magro que o padrão de beleza impõe. Sua vida começa a ser balançada quando o diretor de um documentário a procura, insistindo que ela tope dar seu depoimento sobre um evento traumático do seu tempo de escola. Ani hesita, pois não quer que as sombras de seu passado atrapalhem seu presente e futuro brilhantes – até que, aos poucos, vai ficando claro que o castelo que ela construiu é feito de cartas, e qualquer sopro pode fazê-lo desmoronar.

Não demora a ficar claro como o dia que tudo no comportamento de Ani é milimetricamente calculado. Ela sai para almoçar com o namorado e come somente duas fatias da sua pizza napoletana individual, pedindo à garçonete para embalar o resto pra viagem. Quando o noivo vai ao banheiro, ela come o resto da pizza com uma voracidade digna de episódio de compulsão alimentar. Ela então finge que a garçonete derrubou a bebida em cima da pizza e eles vão embora. Esse é apenas um exemplo simples pra evidenciar a atuação que Ani aplica em cada aspecto de sua vida, porque ela deseja ser perfeita e construir a vida perfeita, já que ela não teve nada disso quando era adolescente (e aos poucos vamos entendendo a profundidade do seu trauma). Só que isso também torna a personagem difícil de gostar, pelo menos na maior parte do filme: é difícil torcer por alguém que interpreta um papel forçado para agradar a todos à sua volta. Ani não tem espontaneidade e nem vulnerabilidade, e isso afasta o espectador dela.

Quando ela decide participar do documentário, o filme vai entrando no âmbito do suspense/thriller. Começam a ser exibidas cenas da época em que a protagonista estudou em um colégio particular graças a uma bolsa dada por seu brilhantismo, especialmente em termos de redação. Ao mesmo tempo em que faz amizade com dois outsiders da escola, ela também consegue criar vínculo com o grupinho dos populares, e começa a namorar um deles. Uma festa dos alunos é o estopim para uma sequência de eventos destrutiva para todos os envolvidos, e as peças aos poucos se encaixam. O filme demora um pouco a trazer esses elementos à luz, o que pode cansar um pouco o espectador, mas a moral da história por trás de tudo isso vale a espera.

Esse parágrafo é pra discutir o principal ponto do filme, mas é spoiler, então pule para o parágrafo seguinte não quiser ler, tá bem? Uma Garota de Muita Sorte não se destacou pra mim por ser um filme de suspense excelente, mas sim por trazer o tema “consentimento” com tanta veemência e seriedade. Ani foi vítima de um estupro coletivo que, de certa forma, serviu como incentivo para que seus amigos – que já odiavam os populares – somassem o trauma dela aos seus próprios e resolvessem fazer um tiroteio na escola. Tudo isso faz com que a personagem de Mila Kunis sofra um trauma que a impede de seguir a vida normal, porque ela nunca se curou desse passado. Enquanto isso, um dos rapazes que a estuprou ficou paraplégico no tiroteio e se tornou uma espécie de “herói nacional” ao escrever livros e dar palestras contra o armamento da população; acontece que ninguém sabe do estupro, porque quando Ani tentou denunciar, ninguém deu ouvidos. Uma Garota de Muita Sorte machuca ao mostrar a dura realidade do que acontece quando pessoas que deveriam proteger simplesmente negligenciam a vítima, que precisa viver não apenas a violência do ato como também a humilhação de ser desacreditada. A atuação de Mila Kunis e de Chiara Aurelia, que a interpreta quando jovem, também merecem destaque: ambas conseguem demonstrar com muita competência a profundidade das cicatrizes emocionais causadas por tudo que aconteceu. Como crítica negativa, fica uma decisão desnecessária do roteiro: precisavam mesmo terem sido tão gráficos nas cenas de estupro? Eu respondo: não. É desconfortável e degradante ver Ani naquela situação, e a falta de um trigger warning pra quem já passou por violências semelhantes me preocupa. Não me impressiona que o filme tenha sido dirigido por um homem, porque acho improvável que uma mulher que se preocupe minimamente com o impacto da violência sexual fosse escolher esse caminho narrativo. :/ 

Uma Garota de Muita Sorte é um bom filme sobre traumas, sobre o peso de ser mulher em uma sociedade que nos sexualiza e nos descredibiliza e sobre ser fiel a si mesma. A jornada de Ani para recuperar o controle da própria vida e narrativa é bastante comovente, porque aos poucos ela vai percebendo que precisa de bases mais sólidas do que aquelas que criou, e vemos sua mudança e seus sacrifícios pra encarar esse novo momento. Ainda que inicialmente a protagonista não seja cativante, aos poucos entendemos o seu jeito e passamos a torcer por ela. Recomendo, mas deixo aqui o trigger warning a respeito da violência sexual.

Título original: Luckiest Girl Alive
Ano de lançamento: 2022
Direção: Mike Barker
Elenco: Mila Kunis, Chiara Aurelia, Finn Wittrock, Connie Britton, Justine Lupe, Alex Barone

Review: Nada de Novo no Front

Oi pessoal, tudo bem?

Nada de Novo no Front é um romance de Erich Maria Remarque (sobre o qual já falei aqui no blog) e que ganhou uma nova adaptação este ano pela Netflix. Considerando que o livro foi um dos mais intensos que já li, estava mais do que ansiosa para conferir esse longa cheio de potencial.

Sinopse: Convocado para a linha de frente da Primeira Guerra Mundial, o adolescente Paul encara a dura realidade da vida nas trincheiras.

A trama gira em torno da Primeira Guerra Mundial, sob o ponto de vista dos soldados alemães – especialmente do protagonista, Paul Bäumer. O filme começa em 1917, no terceiro ano de guerra, e Paul e seus três amigos (Ludwig, Franz e Kropp) são motivados pelos professores e pelo idealismo nacionalista a se alistarem. Ainda que a família de Paul fosse contra, o rapaz não deseja ficar pra trás, querendo cumprir seu papel de herói patriótico ao lado dos camaradas. O filme evidencia de cara os sorrisos nos rostos dos recrutas, a forma empolgada como eles cantam suas canções e a inflamação provocada por discursos apaixonados de professores e figuras de poder em relação à guerra e ao papel da Alemanha nela. Porém, quando chegam no acampamento e se preparam para ir até o front, o grupo de amigos sente o baque do que a guerra realmente representa: fome, frio, falta de higiene, doenças e, é claro, a iminência constante da morte. Paul então vê cada um desses elementos atingirem a si e ao seu grupo, enquanto os rapazes vão perecendo e deixando Paul sozinho.

Quando terminei o longa, cheguei à conclusão de que ele é um excelente filme sobre guerra, mas não uma excelente adaptação literária. O início de Nada de Novo no Front segue bastante a atmosfera e a trama criadas por Remarque em sua obra, mas da metade pro final o filme toma decisões próprias que o afastam do material base. Como eu não sou fã de filmes de guerra e só estava assistindo por amar o livro, isso acabou me desapontando um pouco. Mas, se você não leu a obra original e curte esse estilo de filme, certamente vai adorar, porque é um longa muito competente em equilibrar excelentes atuações, cenas de guerra aflitivas e violentas e também expor as hipocrisias dos diplomatas, que bebem vinho e tomam decisões literalmente de vida ou morte enquanto os soldados se matam no campo de batalha.

A entrega total do elenco é fundamental pra tornar Nada de Novo no Front mais do que um filme de guerra. O desespero de Ludwig, por exemplo, é palpável: ele não demora a perceber o risco que corre e o arrependimento por ter se alistado. Paul, por sua vez, tem seu rosto completamente mudado do início pro meio e pro fim do filme: o brilho no olhar se vai e os sorrisos se tornam mais raros, o cansaço está estampado em cada linha de expressão, bem como sua desolação. Felix Kammerer, o ator que dá vida ao protagonista, me impactou com sua performance, transmitindo com poucas palavras o quanto a guerra destruiu os sonhos do jovem Paul.

E já que estamos falando sobre as emoções dos personagens, é aqui que entra uma diferença absurda da adaptação que eu senti muita falta. Enquanto o longa se concentra 100% na guerra nas trincheiras e nas negociações que acontecem em paralelo, o livro tem momentos emocionantes fora desses cenários. Paul chega a ir para casa duas vezes na obra original, e eu lembro que essas ocasiões foram muito marcantes durante a leitura, porque evidenciam a sensação de desconexão do personagem com o “mundo normal”. Ao tentar se readequar à sociedade, Paul se sente um outsider, pois ninguém ali sabe o que ele vivenciou e é capaz de compartilhar da sua dor e de seus traumas. Por outro lado, fiquei contente em ver que o filme adaptou uma das melhores sequências do livro: o surto de Paul após vitimar um homem na luta corpo a corpo pela primeira vez. O rapaz fica desesperado por suas mãos terem sido a causa daquela vida ter chegado ao fim, e é uma cena marcante porque mostra ao protagonista que os inimigos também são pessoas normais, com vidas e famílias. Acho que grande parte da carga emocional do livro reside nesses dois momentos (a inadequação fora da guerra e a morte do soldado francês), e eu teria adorado ver ambos retratados na tela.

Nada de Novo no Front é um filme melancólico, intenso e que causa um desconforto no estômago (ainda mais pelas mudanças que o roteiro optou por fazer no final, me pegando desprevenida). Ele revolta, especialmente quando coloca homens cheios de ego – mas convenientemente bem longe da batalha – tomando decisões que vão afetar permanentemente a vida dos soldados, ou até mesmo causando suas mortes. O patriotismo incentivado pelas figuras de referência dos jovens é usado para manipulá-los e levá-los a lutar uma batalha que não é sua, em nome de uma honra que não existe. Porque não existe honra na guerra, ela nada mais é do que a evidência de que falhamos enquanto seres humanos e falhamos na capacidade de dialogar. Nesse sentido, filmes como Nada de Novo no Front servem como um alerta doloroso e necessário de que os poderosos não ligam para a vida humana, desde que seus objetivos sejam alcançados. Assim como o livro, recomendo sem pensar duas vezes.

Título original: Im Westen nichts Neues
Ano de lançamento: 2022
Direção: Edward Berger
Elenco: Felix Kammerer, Albrecht Schuch, Aaron Hilmer, Moritz Klaus, Adrian Grünewald, Edin Hasanovic, Daniel Brühl, Devid Striesow